sexta-feira, 15 de julho de 2011

DIVERSAS ENCARNAÇÕES DE UM ESPÍRITO.

VISÃO RETROSPECTIVA DE DIVERSAS ENCARNAÇÕES DE UM ESPÍRITO.
SONO DOS ESPÍRITOS - Pelo doutor Cailleux.
(Sociedade Espírita de Paris, 11 de maio de 1866. - Médium, Sr. Morin.)

Vossa boa acolhida e as boas preces que fizestes em minha intenção me fazem um dever agradecê-las vivamente e vos assegurar de meu eterno devotamento. Depois de minha entrada na verdadeira vida, bem depressa me familiarizei com todas as novidades, mas bem doces exigências de minha situação atual. De todos os lados, hoje, me chamam, não mais como outrora, para dar meus cuidados aos corpos doentes, mas para levar alívio aos doentes da alma. A tarefa é doce para ser cumprida, e com tanto maior rapidez quanto outrora punha-me a transportar-me à cabeceira dos enfermos; posso mesmo, e isto nada tem de espantoso para mim, transportar-me quase instantaneamente de um ponto a outro, com a mesma facilidade que o meu pensamento de passar de um assunto a um outro. Apenas o que me espanta é que posso fazê-lo, eu!...
Tenho, meus bons amigos, para vos entreter, um fato espiritual que me chega e que venho submeter ao vosso julgamento para que me ajudeis a reconhecer o meu erro, se estiver enganado em minhas apreciações a seu respeito. Médico, vós o sabeis, em minha última encarnação, dei-me com ardor aos estudos de minha profissão. Tudo o que nela me chegava era um assunto de observação. Devo dize-lo, sem orgulho, que adquiri alguns conhecimentos, talvez em razão de que não seguia sempre ao pé da letra a rota traçada por minha rotina. Eu procurava sempre, no moral, o que poderia trazer uma perturbação no físico; foi talvez por isto que conheci um pouco melhor meu ofício do que certos de meus colegas. Enfim, eis aqui: Há alguns dias, senti uma espécie de peso se apoderar de meu Espírito, embora conservando a consciência do meu eu, me senti transportado no espaço; cheguei a um lugar que não tem nome para vós, e me achava numa reunião de Espíritos que, quando vivos, tinham adquirido alguma celebridade pelas descobertas que fizeram.
Lá, não fiquei surpreso de reconhecer nesses anciãos de todas as idades, nesses nomes de todas as épocas, uma semelhança espiritual comigo. Perguntei-me o que tudo isto queria dizer; lhes dirigi perguntas que minha posição me sugeria, mas meu espanto foi maior ainda, em me ouvindo responder eu mesmo. Voltei-me, então, para eles e me achava só.
Eis as minhas deduções..... Dr. CAILLEUX.

NOTA. - O Espírito, tendo parado aí, continuou na sessão seguinte.

A questão dos fluidos que são o fundo de vossos estudos desempenhou um papel muito grande no fato que vos assinalei na última sessão. Posso, hoje, vos explicar melhor o que se passou, e, em lugar de vos dizer que eram minhas conjecturas, posso vos dizer o que me relevaram os bons amigos que me guiam no mundo dos Espíritos.
Quando meu Espírito sofreu uma espécie de entorpecimento, eu estava, por assim dizer, magnetizado pelo fluido de meus amigos espirituais; por uma permissão de Deus, deveria resultar disto uma satisfação moral que, dizem eles, é a minha recompensa, e além disso o encorajamento para caminhar num caminho que meu Espírito segue há um bom número de existências.
Estava, pois, adormecido por um sono magnético-espiritual; vi o passado se formar em um presente fictício; reconheci as individualidades desaparecidas em conseqüência dos tempos, ou antes que não tinham sido senão um único indivíduo. Vi um ser começar uma obra médica; um outro, mais tarde, continuar a obra deixada esboçada pelo primeiro, e assim por diante. Nisso cheguei a ver em menos tempo do que emprego para vo-lo dizer, de idade em idade, se formar, crescer e tornar-se ciência, o que, no princípio, não era senão as primeiras tentativas de um cérebro ocupado de estudos para o alívio da Humanidade sofredora. Vi tudo isto, e quando cheguei ao último desses seres que, sucessivamente, tinham levado um complemento à obra, então me reconheci. Ali, tudo se desvanecendo, revivi o Espírito ainda atrasado de vosso pobre doutor. Ora, eis a explicação. Não vo-la dou para disso tirar vaidade, longe disto, mas antes para vos fornecer um assunto de estudo, em vos falando do sono espiritual, que, sendo elucidado por vossos guias, não pode senão me ser útil, porque assisto a todos os vossos trabalhos.
Vi, nesse sono, os diferentes corpos que meu Espírito animou há um certo número de encarnações, e todos trabalharam a ciência médica sem jamais se afastar dos princípios que o primeiro tinha elaborado. Esta última encarnação não era para aumentar o saber, mas simplesmente para praticar o que a minha teoria ensinava.
Com tudo isto permaneço sempre vosso devedor; mas se o permitirdes, virei vos pedir lições, e algumas vezes vos dar a minha opinião pessoal sobre certas questões. Dr. CAILLEUX.

ESTUDO.
Há aqui um duplo ensinamento: primeiro, é o fato da magnetização de um Espírito por outros Espíritos, e do sono que lhe foi a conseqüência; e, em segundo lugar, da visão retrospectiva dos diferentes corpos que animou.
Há, pois, para os Espíritos, uma espécie de sono, o que é um ponto de contato a mais entre o estado corpóreo e o estado espiritual. Trata-se aqui, é verdade, do sono magnético, mas existiria para eles um sono natural semelhante ao nosso? Isto não teria nada de surpreendente, quando se vêem ainda Espíritos de tal modo identificados com o estado corpóreo, que tomam seu corpo fluídico por um corpo material, que crêem trabalhar como o faziam sobre a Terra, e que lhe sentem a fadiga. Se eles sentem a fadiga, devem sentir a necessidade do repouso, e podem acreditar se deitar e dormir, como crêem trabalhar, e ir em estrada de ferro. Dizemos que o crêem, para falar do nosso ponto de vista; porque tudo é relativo, e com relação à sua natureza fluídica, a coisa é inteiramente tão real quanto as coisas materiais o são para nós.
Não são senão os Espíritos de uma ordem inferior que têm semelhantes ilusões; quanto menos são avançados, mais seu estado se aproxima do estado corpóreo. Ora, esse não pode ser o caso do doutor Cailleux, Espírito avançado que se dá perfeitamente conta de sua situação. Mas nisso não é menos verdadeiro que teve a consciência de um entorpecimento análogo ao sono durante o qual viu suas diversas individualidades. Um membro da sociedade explica esse fenômeno desta maneira: No sono humano, só o corpo repousa, mas o Espírito não dorme. Deve ser o mesmo no estado espiritual; o sono magnético ou outro não deve afetar senão o corpo espiritual ou perispírito, e o Espírito deve se encontrar num estado relativamente análogo ao do Espírito encarnado durante o sono do corpo, quer dizer, conservar a consciência de seu ser. As diferentes encarnações do Sr. Cailleux, que seus guias espirituais queriam fazê-lo ver para sua instrução, puderam se apresentar a ele, como lembrança, da mesma maneira que as imagens se oferecem nos sonhos.
Esta explicação é perfeitamente lógica; foi confirmada pelos Espíritos que, provocando o relato do doutor Cailleux, quiseram nos fazer conhecer uma nova fase da vida de além-túmulo.

VISÃO RETROSPECTIVA DAS EXISTÊNCIAS DOS ESPÍRITOS.
A propósito do doutor Cailleux.
Um dos nossos correspondentes, de Lyon, nos escreveu o que segue:

"Fiquei surpreso que o espírito do doutor Cailleux tenha sido colocado num estado magnético para ver se desenrolar, diante dele, o quadro de suas existências passadas. (Revista de junho de 1866, página 175.) Isto parece indicar que o Espírito em questão não as conhecia; porque vejo em O Livro dos Espíritos que: "Depois da morte, a alma vê e abarca de um golpe de olhar suas emigrações passadas." (Cap. VI, n- 243.) Este fato não parece implicar uma contradição?"

Não há ali nenhuma contradição, uma vez que o fato vem, ao contrário, confirmar a possibilidade, para o Espírito, de conhecer suas existências passadas. O Livro dos Espíritos não é um tratado completo do Espiritismo; não faz senão colocar-lhe as bases e os pontos fundamentais, que devem se desenvolver sucessivamente pelo estudo e pela observação. Ele diz, em princípio, que depois da morte a alma vê suas emigrações passadas, mas não diz nem quando, nem como isto se faz: estão aí os detalhes da aplicação que estão subordinados às circunstâncias. Sabe-se que, entre os Espíritos atrasados, a visão é limitada ao presente, ou quase, como sobre a Terra; ela se desenvolve com a inteligência, e à medida que eles adquirem a consciência de sua situação. Não seria preciso crer, aliás, que, mesmo entre os Espíritos avançados, como o Sr. Cailleux, por exemplo, logo entrados no mundo espiritual, todas as coisas lhe aparecessem subitamente como numa mudança de decoração à vista, nem que têm constantemente sob os olhos o panorama do tempo e do espaço; quanto às suas existências anteriores, eles as vêem em lembrança, como vemos, pelo pensamento, o que éramos e o que fazíamos nos anos anteriores, as cenas de nossa infância, as posições sociais que ocupamos; essa lembrança é mais ou menos precisa ou confusa, algumas vezes é nula, segundo a natureza do Espírito, e segundo o que a Providência julga a propósito de a apagar ou reavivá-la, como recompensa, punição ou instrução. É um grande erro crer que as aptidões, as faculdades e as percepções são as mesmas em todos os Espíritos; como na encarnação, eles têm as percepções morais e as que se podem chamar materiais, que variam segundo os indivíduos.
Se o doutor Cailleux tivesse dito que os Espíritos não podem ter conhecimento de suas existências passadas, aí estaria a contradição, porque isso seria a negação de um princípio admitido; longe disso afirma o fato; somente, as coisas não se passam nele de maneira diferente que em outros, sem dúvida, por motivos de utilidade para ele, e para nós é um objeto de ensino, uma vez que isso nos mostra um dos lados do mundo espiritual. O Sr. Cailleux estava morto há pouco tempo; suas existências passadas
poderiam, pois, se retratarem ainda nitidamente em sua memória. Observamos, além disso, que aqui não era uma simples lembrança; era a própria visão das individualidades que tinha animado, a imagem de suas antigas formas perispirituais que se apresentava a ele; ora, o estado magnético no qual se encontrou, era provavelmente necessário à produção do fenômeno.
O Livro dos Espíritos foi escrito na origem do Espiritismo, numa época em que se estava longe de ter feito todos os estudos práticos que se fizeram depois; as observações ulteriores vieram desenvolver e completar os princípios dos quais havia colocado os germes, e é mesmo digno de nota que, até este dia, elas não fizeram senão confirmá-los, sem jamais contradizê-los nos pontos fundamentais.





Nota: Mensalmente a Sociedade Espírita Caminho da Paz realiza estudo específico sobre a Revista Espírita de Allan Kardec