quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Um olhar no passado sobre o Bom Senso de Kardec e a atualidade com os Espíritas e o Movimento Espírita...


Estudando o livro um tanto esquecido dos “espíritas” - Obras Póstumas, vamos encontrar Allan Kardec esclarecendo sobre o aperfeiçoamento moral dos espíritas, destacando o tema “Os desertores”. Podemos de imediato deduzir sobre os entraves, das situações lamentáveis geradas pela imprudência de alguns, gerando situações daquelas que, dentro do movimento espírita, cultivam discórdias e ciúmes, levantam questões irritantes, propondo cisões, ou tomam-se de entusiasmo irrefletido e danoso. Na sua postura clara e sensata Kardec chama-os de espíritas de contrabando, já que adentraram o meio espírita sem a devida “chancela” moral. Pois bem: depois de alertar-nos quanto a esse caso, Kardec prossegue aprofundando no assunto:

Se passarmos à categoria dos espíritas propriamente ditos, ainda aí depararemos com certas fraquezas humanas, das quais a doutrina não triunfa imediatamente. As mais difíceis de vencer-se são o egoísmo e o orgulho, as duas paixões fundamentais do homem. Entre os adeptos convictos, não há deserções, na lídima acepção do termo, visto como aquele que desertasse, por motivo de interesse ou qualquer outro, nunca teria sido sinceramente espírita; pode, entretanto, haver desfalecimentos. Pode dar-se que a coragem e a perseverança fraqueiem diante de uma decepção, de uma ambição frustrada, de uma preeminência não alcançada, de uma ferida no amor-próprio, de uma prova difícil. Há o recuo ante o sacrifício do bem-estar, ante o receio de comprometer os interesses materiais, ante o medo do que dirão; há o ser-se abatido por uma mistificação, tendo como consequência, não o afastamento, mas o esfriamento; há o querer viver para si e não para os outros, o beneficiar-se da crença, mas sob a condição de que isso nada custe. Sem dúvida, podem os que assim procedem ser crentes, mas, sem contestação, crentes egoístas, nos quais a fé não ateou o fogo sagrado do devotamento e da abnegação; às suas almas custa o desprenderem-se da matéria. Fazem nominalmente número, porém não há contar com eles.

Todos os outros são espíritas que em verdade merecem esse qualificativo. Aceitam por si mesmos todas as consequências da doutrina e são reconhecíveis pelos esforços que empregam por melhorar-se. Sem desprezarem, além dos limites do razoável, os interesses materiais, estes são, para eles, o acessório e não o principal; não consideram a vida terrena senão como travessia mais ou menos penosa; estão certos de que do emprego útil ou inútil que lhe derem depende o futuro; têm por mesquinhos os gozos que ela proporciona, em face do objetivo esplêndido que entrevêem no além; não se intimidam com os obstáculos com que topem no caminho; vêem nas vicissitudes e decepções provas que não lhes causam desânimo, porque sabem que o repouso será o prêmio do trabalho. Daí vem que não se verificam entre eles deserções, nem desfalecimentos.


O nascimento de Kardec


(Em casa do Sr. C...; médium: Srta. Aline C...)

MINHA MISSÃO
Pergunta (à Verdade) — Bom Espírito, eu desejara saber o que pensas da missão que alguns Espíritos me assinaram. Dize-me, peço-te, se é uma prova para o meu amor-próprio. Tenho, como sabes, o maior desejo de contribuir para a propagação da verdade, mas, do papel de simples trabalhador ao de missionário em chefe, a distância é grande e não percebo o que possa justificar em mim graça tal, de preferência a tantos outros que possuem talento e qualidades de que não disponho.

Resposta — Confirmo o que te foi dito, mas recomendo--te muita discrição, se quiseres sair-te bem. Tomarás mais tarde conhecimento de coisas que te explicarão o que ora te surpreende. Não esqueças que podes triunfar, como podes falir. Neste último caso, outro te substituiria, porquanto os desígnios de Deus não assentam na cabeça de um homem.

Nunca, pois, fales da tua missão; seria a maneira de a fazeres malograr-se. Ela somente pode justificar-se pela obra realizada e tu ainda nada fizeste. Se a cumprires, os homens saberão reconhecê-lo, cedo ou tarde, visto que pelos frutos é que se verifica a qualidade da árvore.

P. — Nenhum desejo tenho certamente de me vangloriar de uma missão na qual dificilmente creio. Se estou destinado a servir de instrumento aos desígnios da Providência, que ela disponha de mim. Nesse caso, reclamo a tua assistência e a dos bons Espíritos, no sentido de me ajudarem e ampararem na minha tarefa.

 R. — A nossa assistência não te faltará, mas será inútil se, de teu lado, não fizeres o que for necessário. Tens o teu livre-arbítrio, do qual podes usar como o entenderes. Nenhum homem é constrangido a fazer coisa alguma.

P. — Que causas poderiam determinar o meu malogro? Seria a insuficiência das minhas capacidades?

R. — Não; mas, a missão dos reformadores é prenhe de escolhos e perigos. Previno-te de que é rude a tua, porquanto se trata de abalar e transformar o mundo inteiro.
Não suponhas que te baste publicar um livro, dois livros, dez livros, para em seguida ficares tranqüilamente em casa. Tens que expor a tua pessoa. Suscitarás contra ti ódios terríveis; inimigos encarniçados se conjurarão para tua perda; ver-te-ás a braços com a malevolência, com a calúnia, com a traição mesma dos que te parecerão os mais dedicados; as tuas melhores instruções serão desprezadas e falseadas; por mais de uma vez sucumbirás sob o peso da fadiga; numa palavra: terás de sustentar uma luta quase contínua, com sacrifício de teu repouso, da tua tranquilidade, da tua saúde e até da tua vida, pois, sem isso, viverias muito mais tempo. Ora bem! não poucos recuam quando, em vez de uma estrada florida, só vêem sob os passos urzes, pedras agudas e serpentes. Para tais missões, não basta a inteligência. Faz-se mister, primeiramente, para agradar a Deus, humildade, modéstia e desinteresse, visto que Ele abate os orgulhosos, os presunçosos e os ambiciosos.
Para lutar contra os homens, são indispensáveis coragem, perseverança e inabalável firmeza. Também são de necessidade prudência e tato, a fim de conduzir as coisas de modo conveniente e não lhes comprometer o êxito com palavras ou medidas intempestivas. Exigem-se, por fim, devotamento, abnegação e disposição a todos os sacrifícios.
Vês, assim, que a tua missão está subordinada a condições que dependem de ti.
Espírito Verdade

Eu — Espírito Verdade, agradeço os teus sábios conselhos. Aceito tudo, sem restrição e sem ideia preconcebida.
Senhor! pois que te dignaste lançar os olhos sobre mim para cumprimento dos teus desígnios, faça-se a tua vontade!
Está nas tuas mãos a minha vida; dispõe do teu servo.
Reconheço a minha fraqueza diante de tão grande tarefa; a minha boa vontade não desfalecerá, as forças, porém, talvez me traiam. Supre à minha deficiência; dá-me as forças físicas e morais que me forem necessárias. Ampara-me nos momentos difíceis e, com o teu auxílio e dos teus celestes mensageiros, tudo envidarei para corresponder aos teus desígnios.

Sugestão do blog: para maiores detalhes dos problemas enfrentados por Kardec dentro da própria Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, sugerimos a leitura complementar do texto acima. Obras Póstumas, nota de Kardec 10 anos após a fundação da Sociedade.