segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

O Menino Jesus no meio dos doutores - fonte: Revista Espírita, junho de 1862

O Menino Jesus no meio dos doutores
menino_jesus_entre_os_doutores_-_ingreRevista Espírita, junho de 1862

Ultimo quadro do Sr. Ingres. (1)

A senhora Dozon, nossa colega da Sociedade, recebeu em sua casa, em 9 de abril de 1862, a comunicação espontânea seguinte:
"O Menino Jesus encontrado por seus pais pregando no Templo, no meio dos doutores”. (São Lucas, Natividade.)

Tal é o assunto de um quadro inspirado a um dos nossos maiores artistas. Nesta obra do homem se mostra mais do que o gênio; ali se vê brilhar essa luz que Deus dá às almas para esclarecê-las e conduzi-las às regiões celestes. Sim, a religião iluminou o artista. Essa claridade é visível? O trabalhador viu o raio partindo do céu e descendo nele? Viu se divinizar, sob seus pincéis, a cabeça do Menino-Deus? Ajoelhou-se diante dessa criação de inspiração divina, e exclamou, como o santo velho Simeão: Senhor, vós deixareis morrer em paz o vosso servidor, segundo a vossa palavra, uma vez que meus olhos viram o Salvador, que nos dais agora, e que destinastes para ser exposto à visão de todos os povos."

"Sim, o artista pode se dizer servidor do Mestre, porque vem executar uma ordem de sua suprema vontade”. Deus quis que, no tempo em que reina o ceticismo, a multidão se detenha diante dessa figura do Salvador! e mais de um coração se afastará levando uma lembrança que o conduzirá ao pé da cruz, onde esse divino Menino deu sua vida para a Humanidade, para vós, multidão negligente.

"Contemplando o quadro de Ingres, a visão se afasta, com pesar, para retornar a essa figura de Jesus, onde há uma mistura de divindade, de infância e também alguma coisa da flor; essas roupagens, essa veste de cores frescas, jovens, delicadas, lembram esses suaves coloridos sobre os caules perfumados. Tudo merece ser admirado na obra-prima de Ingres. Mas a alma ama, sobretudo, nela contemplar os dois tipos adoráveis de Jesus e de sua divina Mãe. Ainda uma vez, sente-se a necessidade de saudá-la pelas angélicas palavras: "Eu vos saúdo, Maria, cheia de graças." Mal se ousa levar o olhar artístico sobre essa nobre e divinizada figura, tabernáculo de um Deus, esposa de um homem, virgem pela pureza, mulher predestinada às alegrias do paraíso e às agonias da Terra. Ingres compreendeu tudo isto e não se passará diante da Mãe de Jesus sem dizer-lhe: "Maria, muito doce virgem, em nome de vosso filho, orai por nós!" Vós a estudareis um dia; mas eu vi as primeiras pinceladas dadas sobre essa tela bendita. Vi nascer uma a uma as figuras, as poses dos doutores; vi o anjo protetor de Ingres lhe inspirando para fazer cair os pergaminhos das mãos de um desses doutores; porque ali, meu Deus, está toda uma revelação! essa voz de criança destruirá também, uma a uma, as leis que não são suas.

"Não quero fazer aqui da arte como ex-artista; eu sou Espírito, e, para mim, só a arte religiosa me toca. Também vi nesses ornamentos graciosos das cepas de vinha a alegoria   da vinha de Deus, onde todos os humanos devem chegar a se consolar, e disse a mim com uma alegria profunda que Ingres vinha de fazer amadurecer um de seus belos cachos. Sim, mestre! teu Jesus vai falar também diante dos doutores que negam sua lei, diante daqueles que a combatem. Mas quando se encontrarem sós com a lembrança do Menino divino, ah! mais de um rasgará seus rolos de pergaminho sobre os quais a mão de Jesus terá escrito:
Erro.

"Vede, pois, como todos os trabalhadores se reencontram! uns vindo voluntariamente e por caminhos já conhecidos; outros conduzidos pela mão de Deus, que vai procurá-los sobre os lugares e lhes mostra onde devem ir. Outros ainda chegam, sem saber onde estão, atraídos por um encanto que lhes faz semear também as flores de vida para levantar o altar sobre o qual o menino Jesus vem, ainda hoje, para alguns, sob a roupagem de cor de safira ou sob a túnica do crucificado é sempre um mesmo, o único Deus.
"DAVID, pintor."


A senhora Dozon nem seu marido haviam ouvido falar desse quadro; tendo nós mesmos dele nos informado junto a vários artistas, nenhum tinha conhecimento, e começamos a crer numa mistificação. O melhor meio de esclarecer essa dúvida era dirigir-se diretamente ao artista, para se informar se tratara esse assunto; foi o que a senhora Dozon fez. 

Entrando no atelier, viu o quadro, terminado há somente alguns dias e, consequentemente, desconhecido do público. Esta revelação espontânea é tanto mais notável quanto a descrição que dela dá o Espírito é de uma exatidão perfeita. Tudo está ali: cepo de vinha, pergaminhos caídos no chão, etc. Este quadro está ainda exposto na sala do bulevar dos Italianos, onde fomos vê-lo, e ficamos, como todo mundo, admirados diante dessa página sublime, uma das mais belas, sem contradita, da pintura moderna. Do ponto de vista da execução, é digna do grande artista que, o cremos, nada fez de superior, apesar de seus oitenta e três anos; mas o que dela faz uma obra-prima, fora de linha, é o sentimento que a domina, a expressão, o pensamento que faz jorrar, de todas esses rostos sobre os quais lê-se a surpresa, a estupefação, a emoção, a dúvida, a necessidade de negar, a irritação de se ver abater por um menino; tudo isto é tão verdadeiro, tão natural, que se põe a colocar as palavras em cada boca. Quanto ao menino, é de um ideal que deixa longe, atrás dele,
tudo o que foi feito sobre o mesmo assunto; não é um orador que fala aos seus ouvintes: não os olha mesmo; adivinha-se nele o órgão de uma voz celeste.

Em toda esta concepção, sem dúvida, há do gênio, mas há, incontestavelmente, da inspiração. O Sr. Ingres, ele mesmo, disse que não havia composto esse quadro nas condições comuns; começou, disse ele, pela arquitetura, o que não é de seus hábitos; em seguida vieram os personagens, por assim dizer, colocarem-se eles mesmos sob seu pincel, sem premeditação de sua parte. Temos motivos para pensar que esse trabalho se prende a coisas das quais ter-se-á a chave mais tarde, mas sobre as quais devemos ainda guardar o silêncio, como sobre muitas outras.

Tendo o fato acima sido narrado na Sociedade, o Espírito de Lamennais, ditou espontaneamente, nessa ocasião, a comunicação seguinte.

Sobre o quadro do Sr, Ingres.
(Sociedade Espírita de Paris, 2 de maio de 1862. - Médium, Sr. A. Didier.)

Falei-vos, recentemente, de Jesus menino no meio dos doutores, e fazia ressaltar sua iluminação divina no meio das sábias trevas dos sacerdotes judeus. Temos um exemplo a mais de que a espiritualidade e os movimentos da alma constituem a fase mais brilhante na arte. Sem conhecer a Sociedade Espírita, pode-se ser um grande artista espiritualista, e Ingres nos mostra, em sua nova obra, o estudo do artista, mas também sua inspiração mais pura e a mais ideal; não esse falso ideal, que engana tanta gente e que é uma hipocrisia da arte sem originalidade, mas o ideal haurido na natureza simples, verdadeira e, consequentemente, bela em toda a acepção da palavra. Nós outros, Espíritos, aplaudimos as obras espiritualistas tanto quanto censuramos a glorificação dos sentimentos materiais e do mau gosto. É uma virtude sentir a beleza moral e a beleza física nesse ponto; é a marca certa de sentimentos harmoniosos no coração e na alma, e quando o sentimento do belo está desenvolvido nesse ponto, é raro que o sentimento moral não o esteja também. É um grande exemplo o desse velho de oitenta anos, que representa, no meio da sociedade corrompida, o triunfo do Espiritualismo, com o gênio sempre jovem e sempre puro da fé.

LAMENNAIS.

(1) Jean-Auguste Dominique Ingres - de 1780Montauban – 14 de Janeiro de 1867Paris), mais conhecido simplesmente por Ingres, foi um celebrado pintor e desenhista francês, atuando na passagem do Neoclassicismo para o Romantismo. Foi um discípulo de David e em sua carreira encontrou grandes sucessos e grandes fracassos, mas é considerado hoje um dos mais importantes nomes da pintura do século XIX.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

ESTRANHA VIOLAÇÃO DE SEPULTURA. (Estudo psicológico.) - Revista Espírita jan/1868



O Observateur, de Avesnes (vinte de abril de 1867) relata o fato seguinte:

"Há três semanas, um operário de Louvroil, chamado Magnan.com a idade de vinte e três anos, teve a infelicidade de perder sua mulher atingida de uma doença do peito. O desgosto profundo que disto sentiu foi logo acrescido pela morte de seu filho, que não sobreviveu senão alguns dias à sua mãe. Magnan falava sem cessar de sua mulher, não podendo acreditar que ela o tivesse deixado para sempre e imaginando que ela não tardaria a voltar; foi em vão que seus amigos procuraram lhe oferecer algumas consolações, ele as repelia todas e se fechava em sua aflição.

"Quinta-feira última, depois de muitas dificuldades, seus camaradas da oficina decidiram acompanhar, até a estrada de ferro, um amigo comum, militar em licença que retornava ao seu regimento. Mas apenas chegaram à estação e Magnan se esquivou e retornou só à cidade, mas preocupado ainda do que de hábito. Ele tomou num cabaré alguns copos de bebida que acabaram por perturbá-lo, e foi nestas disposições que retornou à sua casa pelas nove horas da noite. Ele se achava só, o pensamento de que sua mulher não estava mais lá o super excitava ainda, e sentiu um desejo insuperável de revê-la. Então, tomou uma velha pá e um mau sulcador, foi ao cemitério, e, apesar da obscuridade e da chuva horrível que caía nesse momento, ele começou logo a tirar a terra que recobria sua querida defunta.

Não foi senão várias horas depois de um trabalho sobre-humano que ele chegou a retirar o caixão de sua fossa. Unicamente com as suas mãos, e quebrando todas as unhas, arrancou a tampa, depois, tomando em seus braços o corpo de sua pobre companheira, ele levou-a à sua casa e deitou-a em seu leito. Deveria ser, então, em torno de três horas da manhã. Depois de ter aceso um bom fogo descobriu o rosto da morta, depois, quase feliz, correu à casa da vizinha que a tinha enterrado, para lhe dizer que sua mulher tinha voltado, como ele o havia predito.

"Sem dar nenhuma importância às palavras de Magnan, que, dizia ela, tinha visões, levantou-se e o acompanhou até sua casa, a fim acalmá-lo e fazê-lo deitar. Que se julgue de sua surpresa e de seu pavor vendo o corpo exumado. O infeliz operário falava a morta como se ela pudesse ouvi-lo e procurava, com uma tenacidade tocante obter uma resposta, dando à sua voz a doçura e toda a persuasão da qual era capaz; essa afeição além do túmulo oferecia um espetáculo doloroso.

"No entanto, a vizinha teve a presença de espírito de convidar o pobre alucinado a levar de novo sua mulher e seu caixão, o que prometeu vendo o silêncio obstinado daquela que ele acreditava ter voltado à vida; foi sob a fé dessa promessa que ela reentrou em sua casa mais morta do que viva.
Mas Magnan não se conservou lá e correu a despertar dois vizinhos que se levantaram, como a enterradora, para procurar tranqüilizar o infortunado. Como ela também, o primeiro momento de estupefação passado, convidaram-no a repor a morta no cemitério, e desta vez este, sem hesitar, tomou sua mulher em seus braços e retornou a depositá-lo no caixão mortuário de onde a havia tirado, colocou-a na fossa e cobriu-a de terra.

"A mulher de Magnan foi enterrada há dezessete dias; no entanto, ela se encontrava ainda num estado perfeito de conservação, porque a expressão de seu rosto era exatamente a mesma do momento em que foi enterrada. "Quando se interrogou Magnan, no dia seguinte, ele pareceu não se lembrar do que havia feito nem do que tinha se passado algumas horas antes; disse somente que acreditava ter visto sua mulher durante a noite." (Siecle, 20 de abril de 1867.)

INSTRUÇÕES SOBRE O FATO PRECEDENTE.

(Sociedade de Paris, 10 de maio de 1867; médium, Sr. Morin, em sonambulismo espontâneo.)

Os fatos se mostram de toda parte, e tudo o que se produz parece ter uma direção especial que leva aos estudos espirituais. Observai bem, e vereis, a cada instante, coisas que parecem, à primeira vista, anomalias na vida humana, e das quais se procuraria inutilmente a causa em outra parte do que na vida espiritual. Sem dúvida, para muitas pessoas, são simplesmente fatos curiosos nos quais não pensam mais, a página virada; mas outros pensam mais seriamente; procuram uma explicação, e, à força de ver a vida espiritual se levantar diante deles, serão muito obrigados em reconhecer que só lá está a solução do que não podem compreender. Vós que conheceis a vida espiritual, examinai bem os detalhes do fato que acaba de vos ser lido, e vede se ela não se mostra ali com evidência.

Não penseis que os estudos que fazeis sobre esses assuntos da atualidade e outros estejam perdidos para as massas, porque, até o presente, elas não vão pouco senão aos Espíritas, àqueles que já estão convencidos; não. Primeiro, estejais certos que os escritos Espíritas vão a outra parte do que a casa dos adeptos; há pessoas muito interessadas na questão para não se manterão corrente de tudo o que fazeis e da marcha da Doutrina.

Sem que isto pareça, a sociedade, que é o centro onde se elaboram os trabalhos, é um ponto de mira, e as soluções sábias e racionais que dela saem fazem refletir mais do que não credes. Mas um dia virá em que esses mesmos escritos serão lidos, comentados, analisados publicamente; ali se haurirá a mancheias os elementos sobre os quais devem assentaras novas idéias, porque ali se encontrará a verdade. Ainda uma vez, estejais convencidos de que nada do que fazeis está perdido, mesmo para o presente, com mais forte razão para o futuro.

Tudo é assunto de instrução para o homem que reflete. No fato que vos ocupa, vedes um homem possuindo suas faculdades intelectuais, suas forças materiais, e que parece, por um momento, completamente despojado das primeiras; ele faz um ato que parece, de início, insensato. Pois bem! há nisso um grande ensinamento.
Isto aconteceu? dirão algumas pessoas. O homem estava num estado de sonambulismo natural ou sonhou? O Espírito da mulher está por alguma coisa lá dentro?

Tais são as perguntas que se podem fazer a esse respeito. Pois bem! o Espírito da senhora Magnan foi por muito nesse negócio, e por muito mais do que poderiam supô-lo mesmo os Espíritas.
Seguindo-se o homem com atenção, desde o momento da morte de sua mulher, é visto mudar pouco a pouco; desde as primeiras horas da partida de sua mulher, vê-se seu Espírito tomar uma direção que se acentua, cada vez mais, para chegar ao ato de loucura da exumação do cadáver.

 Há neste ato outra coisa que o desgosto; e, como o ensina O Livro dos Espíritos, como ensinam todas as comunicações: o que não está na vida presente, está no passado, onde lhe é preciso procurar a causa. Não estamos neste mundo senão para cumprir uma missão ou pagar uma dívida; no primeiro caso realiza-se uma tarefa voluntária; no segundo, fazei a contrapartida dos sofrimentos que sentis e tereis a causa desses sofrimentos.
Quando a mulher morreu, ela lá ficou em Espírito, e como o casamento dos fluidos espirituais e os do corpo era difícil de se romper em razão da inferioridade do Espírito, foi lhe necessário um certo tempo para retomar sua liberdade de ação, um novo trabalho para a assimilação dos fluidos; depois, quando estava preparada, ela se apoderou do corpo do homem e o possuiu. É, pois, aqui, um verdadeiro caso de possessão.

O homem não é mais ele, e notai: não é mais ele senão quando a noite vem. Seria preciso entrarem explicações muito longas para vos fazer compreender a causa dessa singularidade; mas, em duas palavras: a mistura de certos fluidos, como em química o ou de certos gases, não pode suportar o brilho da luz. Eis porque certos fenômenos espontâneos ocorrem mais freqüentemente à noite do que de dia.

Ela possui esse homem; manda-o fazer o que ela quer; é ela quem o conduz ao cemitério para lhe mandar fazer um trabalho sobre-humano e fazê-lo sofrer; e no dia seguinte, quando se pergunta ao homem o que se passou, ele está todo estupefato e não se lembra senão de ter sonhado com sua mulher. O sonho era a realidade; ela tinha prometido retornar, e retornou; retornará e o arrastará.

Numa outra existência, houve um crime de empregado; aquele que tinha do que se vingar, deixou o primeiro se encarnar e escolheu uma existência que, pondo-se em relação com ele, lhe permitia realizar sua vingança. Perguntareis por que essa permissão? mas Deus não concede nada que não seja justo e lógico. Um quer se vingar é
preciso que haja, como prova, a ocasião de superar seu desejo de vingança, e o outro deve sentir e pagar o que fez sofrer ao primeiro. O caso aqui é o mesmo; somente os fenômenos não estando terminados, não se estende por mais longo tempo: existirá outra coisa ainda.

POSSESSOS
473. Pode um Espírito tomar temporariamente o invólucro corporal de uma pessoa viva, isto é, introduzir-se num corpo animado e obrar em lugar do outro que se acha encarnado neste corpo?

“O Espírito não entra em um corpo como entras numa casa. Identifica-se com um Espírito encarnado, cujos defeitos e qualidades sejam os mesmos que os seus, a fim de obrar conjuntamente com ele. Mas, o encarnado é sempre quem atua, conforme quer, sobre a matéria de que se acha revestido. Um Espírito não pode substituir-se ao que está encarnado, por isso que este terá que permanecer ligado ao seu corpo até ao termo fixado para sua existência material.”