sábado, 2 de julho de 2011

Estudo sobre a Mediunidade - parte 3

4. Os mecanismos da mediunidade
Na presente seção procuraremos reunir alguns informes sobre os mecanismos da faculdade mediúnica, ou seja, sobre como se dá o fenômeno mediúnico. A fonte básica continuará sendo Allan Kardec. Iniciemos com este trecho, já parcialmente transcrito, do capítulo "Manifestações dos Espíritos" de Obras Póstumas (§ 6, no 34; o destaque é nosso):
O fluido perispirítico é o agente de todos os fenômenos espíritas, que só se podem produzir pela ação recíproca dos fluidos que emitem o médium e o Espírito. O desenvolvimento da faculdade mediúnica depende da natureza mais ou menos expansível do perispírito do médium e da maior ou menor facilidade da sua assimilação pelo dos Espíritos.
Esmiuçando as informações aqui contidas, notamos:
1. O perispírito desempenha papel de capital importância no processo mediúnico.
2. Sendo o perispírito "o agente de todos os fenômenos espíritas", e estes só podendo produzir-se pela ação recíproca dos fluidos que emitem o médium e o Espírito, temos como regra sem exceções que, ocorrendo um fenômeno de comunicação com o mundo espiritual, necessariamente haverá a participação de um médium. Em alguns casos, como em certas manifestações de efeitos físicos, não se nota a presença do médium, mas podemos estar certos de que haverá alguém, em algum lugar, servindo de médium, ainda mesmo que este não esteja consciente do papel que desempenha. Também percebemos que serão vãos os esforços de certos pesquisadores que, desprezando a riquíssima contribuição do Espiritismo para o estudo daquilo que (impropriamente) denominam "paranormalidade", tentam detectar o Espírito unicamente por meio de aparelhos. Se algum instrumento chegar a registrar um espírito, é porque houve a participação oculta de algum médium. Neste caso, seria mais confiável analisar a manifestação diretamente, sem o recurso indireto de instrumentos, que sempre constituem fonte adicional de incertezas.
3. A presença da faculdade mediúnica em alguém liga-se à possibilidade de seu perispírito "expandir-se". Veremos logo mais que essa "expansão" do corpo espiritual pode ser entendida como a sua parcial desvinculação do corpo físico.
4. A efetivação da comunicação exige, além da "expansão" do perispírito do médium, a assimilação deste com o perispírito do Espírito comunicante, ou seja, tem de haver sintonia entre ambos. Esse fato importante, de que o médium em geral não é capaz de comunicar-se indiscriminadamente com todos os Espíritos, é exposto em Obras Póstumas imediatamente após o trecho que acabamos de transcrever (§ 6, no 35; os grifos são nossos):
As relações entre os Espíritos e os médiuns se estabelecem por meio dos respectivos perispíritos, dependendo a facilidade dessas relações do grau de afinidade existente entre os dois fluidos. Alguns há que se combinam facilmente, enquanto outros se repelem, donde se segue que não basta ser médium para que uma pessoa se comunique indistintamente com todos os Espíritos. Há médiuns que só com certos Espíritos podem comunicar-se ou com Espíritos de certas categorias, e outros que não o podem a não ser pela transmissão do pensamento, sem qualquer manifestação exterior.
No exame do assunto do item 3, podemos colher subsídios em André Luiz, o autor espiritual que tanto tem contribuído para a extensão de nosso conhecimento científico acerca da mediunidade. Em sua obra Evolução em Dois Mundos, ao analisar a fase evolutiva em que se elaborava a faculdade de desprendimento do veículo perispiritual durante o sono (capítulo 17, item "Mediunidade espontânea"), adianta esta valiosa informação (grifamos):
Consolidadas semelhantes relações com o Plano Espiritual [...], começaram na Terra os movimentos de mediunidade espontânea, porquanto os encarnados que demonstrassem capacidades mediúnicas mais evidentes, pela comunhão menos estreita entre as células do corpo físico e do corpo espiritual, em certas regiões do campo somático, passaram das observações durante o sono às da vigília, a princípio fragmentárias, mas acentuáveis com o tempo [...].
Vemos, assim, que o respeitado cientista deixa entrever a correlação íntima entre a possibilidade de contato com a realidade espiritual durante a vigília (mediunidade) e um certo "afrouxamento" das ligações entre as células do perispírito e as suas correspondentes do corpo material. Prosseguindo, André Luiz explicita mais essa correlação:
Quanto menos densos os elos de ligação entre os implementos físicos e espirituais, nos órgãos da visão, mais amplas as possibilidades na clarividência, prevalecendo as mesmas normas para a clariaudiência e modalidades outras, no intercâmbio entre as duas esferas [...].
Refletindo um pouco sobre as assertivas de André Luiz, verificamos, inicialmente, que não conflitam com a explicação dada por Kardec, em termos da capacidade de expansão do perispírito do médium. Há, pelo contrário, até um reforço, já que a noção de "expansão" é aqui suficientemente abrangente e flexível para permitir ulteriores elaborações e detalhamentos, dentro da natureza eminentemente progressiva do Espiritismo. Podemos compreender, deste modo, a "expansibilidade" do perispírito como a sua faculdade de desvinculação parcial e temporária do corpo físico, passando, nesse estado especial, a partilhar da realidade do mundo espiritual para nela colher impressões diversas, sem no entanto perder a possibilidade de atuação sobre o corpo denso.
É fundamental deixar claro que o que acabamos de expor não corrobora de modo algum a idéia popular de que no processo mediúnico o Espírito do médium "sai" e "dá lugar" ao Espírito comunicante, que passaria então a servir-se diretamente do corpo do médium. Os Instrutores Espirituais já esclareceram a Kardec, no importante capítulo "Do papel do médium nas comunicações espíritas" de O Livro dos Médiuns que essa idéia não corresponde à realidade. A mensagem sempre passa pelo Espírito do médium, mesmo quando ele não guarda disso a consciência ao despertar do transe. Vejamos o que dizem no item sexto do parágrafo 223:
O Espírito que se comunica por um médium transmite diretamente o seu pensamento, ou este tem por intermediário o Espírito do médium?
"É o Espírito do médium que é o intérprete, porque está ligado ao corpo que serve para falar e por ser necessária uma cadeia entre vós e os Espíritos que se comunicam, como é preciso um fio elétrico para comunicar à grande distância uma notícia e, na extremidade do fio, uma pessoa inteligente que a receba e transmita."
Compreendemos então que, em última instância, o comando do veículo físico só pode ser feito pelo seu próprio "dono". Poderíamos dizer que o corpo material é feito "sob medida" para cada Espírito, e que não "serve" para nenhum outro. O Espírito estranho não tem como agir diretamente sobre as células materiais formadas sob a influência de outro Espírito e para o seu próprio uso.
É interressante notar que nas questões seguintes à transcrita os Espíritos frisam mesmo enfrentando uma oposição inicial de Kardec que essa é uma regra absoluta, sem exceções, nem mesmo na mediunidade dita "mecânica", ou ainda nos casos de efeitos físicos onde uma mensagem inteligente é transmitida (tiptologia, escrita por meio de pranchetas etc). Vemos, na questão 10 do referido parágrafo, que os Espíritos expressam indiretamente sua desaprovação a esse modo de denominar a mediunidade na qual o médium não guarda consciência do conteúdo da cominicação: o médium jamais atua como máquina, mecanicamente.
Resumindo o conteúdo desta seção:
O perispírito desempenha papel essecial em todos os processos mediúnicos.
A faculdade mediúnica liga-se à possibilidade de o perispírito desvincular-se parcialmente do corpo físico durante a vigília.
A comunicação não se efetiva sem que haja sintonia entre os perispíritos do médium e do Espírito.
A comunicação espiritual, ainda que de efeitos físicos, sempre passa pelo Espírito do médium.

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