Todas as aristocracias tiveram sua razão de ser;
nasceram do estado da Humanidade; assim há de acontecer com o que se tornará
uma necessidade. Todas preencheram ou preencherão seu tempo, conforme os
países, porque nenhuma teve por base o princípio moral; só este princípio pode
constituir uma supremacia durável, porque terá a animá-la sentimentos de
justiça e caridade. A essa aristocracia chamaremos: aristocracia intelecto-moral.
Mas, semelhante estado de coisas será possível
com o egoísmo, o orgulho, a cupidez que reinam soberanos na Terra?
Responderemos terminantemente: sim, não só é possível, como se implantará, por
ser inevitável.
Já hoje a inteligência domina; é soberana, ninguém
o pode contestar. É tão verdade isto, que já se vê o homem do povo chegar aos
cargos de primeira ordem. Essa aristocracia não será mais justa, mais lógica,
mais racional, do que a da força bruta, do nascimento, ou do dinheiro? Por que,
então, seria impossível que se lhe juntasse a moralidade?
— Porque, dizem os pessimistas, o mal domina
sobre a Terra.
— Quem ousará dizer que o bem nunca o
sobrepujará?
Os costumes e, por conseguinte, as instituições
sociais, não valem cem vezes mais hoje do que na Idade Média? Cada século não
se assinala por um progresso? Por que, então, a Humanidade pararia, quando
ainda tem tanto que fazer?
Por instinto natural, os homens procuram o seu
bem-estar; se não o acharem completo no reino da inteligência, procurá-lo-ão
algures, e onde poderão encontrá-lo, senão no reino da moralidade? Para isso,
torna-se preciso que a moralidade sobrepuje numericamente. Não há contestar que
muitíssimo se tem que fazer; mas, ainda uma vez, fora tola pretensão dizer-se
que a Humanidade chegou ao apogeu, quando é vista a avançar continuamente pela
senda do progresso.
Digamos, antes de tudo, que os bons, na Terra,
não são absolutamente tão raros como se julga; os maus são numerosos, é infelizmente
verdade; o que, porém, faz pareçam eles ainda mais numerosos é que têm mais
audácia e sentem que essa audácia lhes é indispensável ao bom êxito.
De tal modo, entretanto, compreendem a
preponderância do bem, que, não podendo praticá-lo, com ele se mascaram.
Os bons, ao contrário, não fazem alarde das suas
boas qualidades; não se põem em evidência, donde o parecerem tão pouco
numerosos. Pesquisai, no entanto, os atos íntimos praticados sem ostentação e,
em todas as camadas sociais, deparareis com criaturas de natureza boa e leal em número bastante a vos tranquilizar o coração, de
maneira a não desesperardes da Humanidade.
Depois, cumpre também dizê-lo, entre os maus,
muitos há que apenas o são por arrastamento e que se tornariam bons, desde que
submetidos a uma influência boa. Admitamos que, em 100 indivíduos, haja 25 bons
e 75 maus; destes últimos, 50 se contam que o são por fraqueza e que seriam
bons, se observassem bons exemplos e, sobretudo, se tivessem sido bem
encaminhados desde a infância; dos 25 maus, nem todos serão incorrigíveis.
No estado atual das coisas, os maus estão em
maioria e ditam a lei aos bons. Suponhamos que uma circunstância qualquer opere
a conversão de 50 por cento deles: os bons ficarão em maioria e a seu turno
ditarão a lei; dos 25 outros, francamente maus, muitos sofrerão a influência daqueles,
restando apenas alguns incorrigíveis sem preponderância.
Tomemos um exemplo, para ilustrar o que acabamos de dizer: Há
povos no seio dos quais o assassínio e o roubo são a normalidade, constituindo
exceção o bem. Nos povos mais adiantados e mais bem governados da Europa, o
crime é a exceção; acuado pelas leis, ele nenhuma influência exerce sobre a
sociedade. O que nesses povos ainda predomina são os vícios de caráter: o
orgulho, o egoísmo, a cupidez com seus cortejos.
Por que, progredindo esses povos, os vícios não
se tornariam a exceção, como o são hoje os crimes, ao passo que os povos
inferiores galgariam o nosso nível? Negar a possibilidade dessa marcha
ascendente fora negar o progresso.
Certamente, chegar a tal estado de coisas não
pode ser obra de um dia, mas, se há uma causa capaz de apressar-lhe o advento, essa causa é, sem nenhuma dúvida, o Espiritismo.
Fator, por excelência, da fraternidade humana, por mostrar que as provas da
vida atual são a consequência lógica e racional dos atos praticados nas
existências anteriores, por fazer de cada homem o artífice voluntário da sua
própria felicidade, a vulgarização universal do Espiritismo dará em resultado, necessariamente,
uma elevação sensível do nível moral da atualidade.
Apenas elaborados e coordenados, já os
princípios gerais da nossa filosofia hão congregado, em imponente comunhão de
idéias, milhões de adeptos espalhados por toda a Terra.
Os progressos realizados pela sua influência, as
transformações individuais e locais que eles têm provocado em menos de quinze anos, permitem apreciemos as
modificações imensas e radicais que operarão no futuro.
Mas, se, graças ao desenvolvimento e à aceitação
geral dos ensinos dos Espíritos, o nível moral da Humanidade tende constantemente a elevar-se, singularmente
se iludiria quem supusesse que a moralidade preponderará sobre a inteligência. O Espiritismo, com efeito, não
quer que o aceitem cegamente; reclama a discussão e a luz.
“Em vez da fé cega, que aniquila a liberdade de
pensar, diz ele: Não há fé inabalável, senão a
que possa encarar face a face a razão, em todas as épocas da
Humanidade.
A fé necessita de base e esta base consiste na
inteligência perfeita daquilo em que se haja de crer. Para crer, não basta ver, é, sobretudo, preciso compreender.”(O Evangelho segundo o
Espiritismo.) Com bom direito, pois, podemos considerar o Espiritismo como um dos
mais fortes precursores da aristocracia do futuro, isto é, da aristocracia intelecto-moral.
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