(Sociedade Espírita
de Paris. Médium, senhorita A. C.)
Publicado na Revista
Espírita - Jornal de Estudos Psicológicos - 7º ano - Nº 1 - Janeiro de 1864
A reencarnação é necessária enquanto a
matéria domina o Espírito; mas do momento em que o Espírito encarnado chegou a
dominar a matéria e anular os efeitos de sua reação sobre o moral, a
reencarnação não tem mais nenhuma utilidade nem razão de ser. Com efeito, o
corpo é necessário ao Espírito para o trabalho progressivo até que, tendo
chegado a manejar esse instrumento à sua maneira, a lhe imprimir a sua vontade,
o trabalho está realizado. É-lhe preciso, então, um outro campo para a sua
caminhada, para o seu adiantamento no infinito; lhe é preciso um outro círculo
de estudos onde a matéria grosseira das esferas inferiores seja desconhecida.
Tendo sobre a Terra, ou em globos análogos, depurado e experimentado suas
sensações, está maduro para a vida espiritual e seus estudos. Tendo se elevado
acima de todas as sensações corpóreas, não tem mais nenhum desses desejos ou
necessidades inerentes à corporeidade: ele é Espírito e vive pelas sensações
espirituais que são infinitamente mais deliciosas do que as mais agradáveis
sensações corpóreas.
II - A reencarnação e
as aspirações do homem.
As aspirações da alma ocasionam a sua
realização, e esta realização se cumpre na reencarnação enquanto o Espírito está
no trabalho material; eu me explico. Tomemos o Espírito em seu início na
carreira humana; estúpido e bruto, sente, no entanto, a centelha divina nele,
uma vez que adora um Deus, que ele materializa segundo a sua materialidade.
Nesse ser, ainda vizinho do animal, há uma aspiração instintiva, quase
inconsciente, rumo a um estado menos inferior. Começa por desejar satisfazer
seus apetites materiais, e inveja aqueles que vê num estado melhor do que o
seu; também, numa encarnação seguinte, ele mesmo escolhe, ou antes, é arrastado
a um corpo mais aperfeiçoado; e sempre, em cada uma de suas existências, deseja
uma melhoria material; não se achando jamais feliz, quer sempre subir, porque a
aspiração à felicidade é a grande alavanca do progresso.
À medida que suas sensações corpóreas
se tornam maiores, mais refinadas, suas sensações espirituais despertam e
crescem também. Então o trabalho moral começa, e a depuração da alma se une à
aspiração do corpo para chegar ao estado superior.
Esse estado de igualdade das aspirações
materiais e espirituais não é de longa duração; logo o Espírito se eleva acima
da matéria, e suas sensações não podem ser satisfeitas por ela; é-lhe preciso
mais; lhe é preciso o melhor; mas aí o corpo, tendo sido levado à sua perfeição
sensitiva, não pode seguir o Espírito, que então o domina e dele se desliga
cada vez mais, como um instrumento inútil. Volta todos os seus desejos, todas
as suas aspirações, para um estado superior; sente que as necessidades
corpóreas, que lhe eram um objeto de felicidade em suas satisfações, não são
mais do que uma tortura, um rebaixamento, do que uma triste necessidade da qual
aspira se libertar para gozar, sem entraves, de todas as felicidades
espirituais que ele pressente.
III - Ação dos
fluidos na reencarnação.
Sendo os fluidos os agentes que colocam
em movimento o nosso aparelho corpóreo, são eles também que são os elementos de
nossas aspirações, porque há fluidos corpóreos e fluidos espirituais, que todos
tendem a se elevarem e se unirem aos fluidos da mesma natureza. Esses fluidos
compõem o corpo espiritual do Espírito que, no estado encarnado, age por eles
sobre a máquina humana que está encarregado de aperfeiçoar, porque tudo é
trabalho na criação, tudo concorre para o adiantamento geral.
O Espírito tem seu livre arbítrio, e
procura sempre o que lhe é agradável e o satisfaz. Se é um Espírito inferior e
material, procura suas satisfações na materialidade, e então dará um impulso
aos seus fluidos corpóreos que dominarão, mas tenderão sempre a crescer e a se
elevar materialmente; portanto, as aspirações desse encarnado são materiais, e,
retornado ao estado de Espírito, procurará uma nova encarnação onde satisfará
as suas necessidades e seus desejos materiais; porque, notai bem, a aspiração
corpórea não pode pedir, como realização, senão uma nova corporeidade, ao passo
que a aspiração espiritual não se prende senão às sensações do Espírito. Ela
será solicitada por seus fluidos que deixou se materializarem; e como no ato da
reencarnação os fluidos agem para atrair o Espírito ao corpo que foi formado,
houve, pois, atração e união dos fluidos, a reencarnação se opera em condições
que darão satisfação às aspirações de sua existência precedente.
Ocorre o mesmo com os fluidos
espirituais com os fluidos materiais, se são eles que dominam; mas então,
quando o espiritual se sobrepôs sobre o material, o Espírito, que julga
diferentemente, escolhe ou é atraído por simpatias diferentes; como lhe é
necessária a depuração, e que não é senão pelo trabalho que a alcança, as
encarnações escolhidas são mais penosas para ele, porque, depois de haver dado
a supremacia à matéria e aos seus fluidos, lhe é necessário constrangê-la,
lutar com ela e dominá-la. Daí essas existências tão dolorosas e que parecem,
frequentemente, tão injustas, infligidas a Espíritos bons e inteligentes.
Aqueles fazem sua última etapa corpórea e entram, saindo deste mundo, nas
esferas superiores onde suas aspirações superiores acharão a sua realização.
IV - As afeições
terrestres e a reencarnação.
O dogma da reencarnação indefinida
encontra oposições no coração do encarnado que ama, porque em presença dessa
infinidade de existências, produzindo cada uma delas novos laços, pergunta-se
com medo o que se tornam as afeições particulares, e se elas não se fundem num
único amor geral, o que destruiria a persistência da afeição individual.
Pergunta-se se essa afeição individual não é somente um meio de adiantamento, e
então o desencorajamento se insinua em sua alma, porque a verdadeira afeição
sente a necessidade de um amor eterno, sentindo que não se deixará jamais de
amar. O pensamento de milhares dessas afeições idênticas lhe parece uma
impossibilidade, mesmo admitindo faculdades maiores para o amor.
O encarnado que estuda seriamente o
Espiritismo, sem tomar partido por um sistema antes que por um outro, se
encontra arrastado para a reencarnação pela justiça que decorre do progresso e
do adiantamento do Espírito em cada nova existência; mas quando o estuda do
ponto de vista das afeições do coração, duvida e se atemoriza apesar dele. Não
podendo colocar de acordo esses dois sentimentos, se diz que ali ainda tem um
véu a levantar, e seu pensamento nesse trabalho atrai as luzes dos Espíritos
para concordar seu coração e sua razão.
Eu disse precedentemente: a encarnação
se detém lá onde a materialidade é anulada. Mostrei como o progresso material
havia de início refinado as sensações corpóreas do Espírito encarnado; como o
progresso espiritual, tendo vindo em seguida, havia contrabalançado a
influência da matéria, depois a havia, enfim, subordinado à sua vontade, e, que
chegado a esse grau de domínio espiritual, a corporeidade não tinha mais razão
de ser, o trabalho estando realizado.
Examinemos agora a questão da afeição sob
esses dois aspectos, material e espiritual.
De início, o que é a afeição, o amor?
Ainda a atração fluídica atraindo dois seres um para o outro, e unindo-os num
mesmo sentimento. Essa atração pode ser de duas naturezas diferentes, uma vez
que os fluidos são de duas naturezas. Mas para que a afeição persista
eternamente, é preciso que ela seja espiritual e desinteressada; é preciso a
abnegação, o devotamento, e que nenhum sentimento pessoal seja o móvel desse
arrastamento simpático. Do momento em que haja, nesse sentimento,
personalidade, há materialidade; ora, nenhuma afeição material persiste nos
domínios do Espírito. Portanto, toda afeição que não seja senão o resultado do
instinto animal ou do egoísmo, se destrói à morte terrestre. Também, que seres
supostamente amados são esquecidos depois de pouco tempo de separação! Vós os
haveis amado por vós e não por eles, aqueles que não são mais, uma vez que os
esquecestes e substituístes; procurastes a consolação no esquecimento; eles se
vos tornam indiferentes, porque não tendes mais amor.
Contemplai a Humanidade, e vede o
quanto há pouca afeição verdadeira sobre a Terra! Também não se deve tanto se
amedrontar com a multiplicidade das afeições contraídas nesse mundo; elas são
em minoria relativa, mas existem, e as que são reais persistem e se perpetuam
sob todas as formas, sobre a Terra, de início, depois continuam no estado de
Espírito numa amizade ou um amor inalterável, que não faz senão crescer em se
elevando mais.
Vamos estudar esta verdadeira afeição: a
afeição espiritual.
A afeição espiritual tem por base a
afinidade fluídica espiritual, que, agindo sozinha, determina a simpatia.
Quando ocorre assim, é a alma que ama a alma, e essa afeição não toma força
senão pela manifestação dos sentimentos da alma. Dois Espíritos unidos
espiritualmente se procuram e tendem sempre a se aproximarem; seus fluidos são
atrativos. Que estejam num mesmo globo, serão levados um para o outro; que
estejam separados pela morte terrestre, seus pensamentos se unirão na
lembrança, e a união se fará na liberdade do sono; e quando a hora de uma nova
encarnação soar para um deles, procurará se aproximar de seu amigo entrando
nisso que é sua filiação material, e fá-lo-á com tanto mais facilidade quanto
seus fluidos perispirituais materiais encontrarem afinidade na matéria corpórea
dos encarnados que deram a luz ao novo ser. Daí um novo aumento da afeição, uma
nova manifestação do amor. Tal Espírito amigo vos amou como pai, vos amará como
filho, como irmão ou como amigo, e cada um desses laços aumentará de encarnação
em encarnação, e se perpetuará de maneira inalterável quando, vosso trabalho
estando feito, vivereis da vida do Espírito.
Mas essa verdadeira afeição não é comum
sobre a Terra, e a matéria vem retardá-la, anulando-lhe os efeitos, segundo ela
domine o Espírito. A verdadeira amizade, o verdadeiro amor sendo espiritual,
tudo o que se relaciona com a matéria não é de sua natureza, nem concorre em
nada para a identificação espiritual. A afinidade persiste, mas fica no estado
latente até que o fluido espiritual se sobrepondo, o progresso simpático se
efetue de novo. Para me resumir, a afeição espiritual é a única resistência no
domínio do Espírito; sobre a Terra e nas esferas de trabalho corpóreo, ela
concorre para o adiantamento moral do Espírito encarnado que, sob a influência
simpática, cumpre milagres de abnegação e de devotamento pelos seres amados.
Aqui, nas moradas celestes, ela é a satisfação completa de todas as aspirações,
e a maior felicidade que o Espírito possa sentir.
V - O progresso
entravado pela reencarnação indefinida. 
Até aqui a reencarnação foi admitida de
um modo muito prolongado; não se pensou senão nessa prolongação da
corporeidade, embora cada vez menos material, ocasionando, no entanto, necessidades
que deviam entravar o voo do Espírito. Com efeito, admitindo a persistência da
geração nos mundos superiores, atribui-se ao Espírito encarnado necessidades
corpóreas, dão-lhe deveres e ocupações ainda materiais que constrangem e detêm
o impulso dos estudos espirituais. Que necessidade desses entraves? O Espírito
não pode gozar as felicidades do amor sem sofrer as enfermidades corpóreas?
Sobre a própria Terra, esse sentimento existe por si mesmo, independente da
parte material de nosso ser; os exemplos, embora sejam raros, estão aí,
suficientes para provar que deve ser sentido mais geralmente entre os seres
mais espiritualizados.
A reencarnação ocasiona a união dos
corpos, o amor puro somente a união das almas. Os Espíritos se unem segundo
suas afeições começadas nos mundos inferiores, e trabalham juntos para o seu
adiantamento espiritual. Eles têm uma organização fluídica muito diferente
daquela que era a consequência de seu aparelho corpóreo, e seus trabalhos se
exercem sobre os fluidos e não sobre os objetos materiais. Vão em esferas que,
também elas, cumpriram seu período material, em esferas cujo trabalho humano
levou a desmaterialização, e que, chegados ao apogeu de seu aperfeiçoamento,
também passaram por uma transformação superior, que os torna próprios para
sofrer outras modificações, mas num sentido todo fluídico.
Compreendeis, desde hoje a força imensa
do fluido, força que não podeis senão constatar, mas que não vedes nem
apalpais. Num estado menos pesado do que aquele em que estais, teríeis outros
meios de ver, de tocar, de trabalhar esse fluido que é o grande agente da vida
universal. Porque, pois, o Espírito teria ainda necessidade de um corpo que
está fora das apreciações corpóreas? Dir-me-eis que esse corpo está em relação
com os novos trabalhos que o Espírito terá que cumprir; mas uma vez que esses
trabalhos serão todo fluídicos e espirituais nas esferas superiores, por que
dar-lhe o embaraço das necessidades corpóreas, porque a reencarnação ocasiona
sempre, como eu o disse, geração e alimentação, quer dizer, necessidade da
matéria a satisfazer, e, em compensação, entraves para o Espírito. Compreendeis
que o Espírito deve ser livre em seu voo para o infinito; compreendeis que
tendo saído dos cueiros da matéria, ele aspira, como a criança, a caminhar e
correr sem ser contido pelas andadeiras maternas, e que essas primeiras
necessidades da primeira educação da criança são supérfluas para a criança
crescida, e insuportáveis ao adolescente. Não desejeis, pois, permanecer na
infância; considerai-vos como alunos fazendo seus últimos estudos escolares, e se
dispondo a entrar no mundo, e a ter nele seu lugar, e a começar os trabalhos de
um outro gênero que seus estudos preliminares terão facilitado.
O Espiritismo é a alavanca que
levantará de um pulo ao estado espiritual todo encarnado que, querendo bem
compreendê-lo e pô-lo em prática, se ligará em dominar a matéria, a dela se
tornar senhor, a aniquilá-la; todo Espírito de boa vontade pode se colocar em
estado de passar, deixando este mundo, ao estado espiritual sem retorno
terrestre; somente, lhe é preciso a fé ou vontade ativa. O Espiritismo a dá a
todos aqueles que querem compreendê-lo em seu sentido moralizador.
Um espírito protetor
do médium.
Nota.
- Esta comunicação não leva outra
assinatura senão esta acima, o que prova que não há necessidade de haver tido
um nome célebre sobre a Terra para ditar boas coisas.
Resumo:
A vida do Espírito, considerada do
ponto de vista do progresso, apresenta três períodos principais, a saber:
1º- O período material onde a influência da matéria domina a do Espírito;
é o estado dos homens dados às paixões brutais e carnais, à sensualidade; cujas
aspirações são exclusivamente terrestres, que são apegados aos bens temporais,
ou refratários às ideias espiritualistas.
2º - O período de equilíbrio; aquele em que as influências da matéria
e do Espírito se exercem simultaneamente; onde o homem, embora submetido às
necessidades materiais, pressente e compreende o estado espiritual; onde ele
trabalha para sair do estado corpóreo.
Nesses dois períodos o Espírito está
submetido à reencarnação, que se cumpre nos mundos inferiores e medianos.
3º - O período espiritual aquele em que o Espírito, tendo
dominado completamente a matéria, não tem mais necessidade da encarnação nem do
trabalho material, seu trabalho é todo espiritual; é o estado dos Espíritos nos
mundos superiores.
A facilidade com a qual certas pessoas
aceitam as ideias espíritas, das quais parecem ter a intuição, indica que
pertencem ao segundo período; mas entre estas e as outras há uma multidão de
graus que o Espírito atravessa tanto mais rapidamente quanto mais próximo
estiver do período espiritual; é assim que, de um mundo material como a Terra,
ele pode ir habitar um mundo superior, como Júpiter, por exemplo, se seu
adiantamento moral e espiritual for suficiente para dispensá-lo de passar pelos
graus intermediários. Depende, pois, do homem deixar a Terra sem retorno, como
mundo de expiação e de prova para ele, ou não retornar a ela senão em missão.
Quando e porque
a Reencarnação passou a ser condenada pela Igreja Católica
O Concílio de Constantinopla – 553 D.C
Até
a metade do século VI, o
Cristianismo aceitava a Reencarnação, fato que a cultura religiosa oriental já aceitava e proclamava, milênios antes da era cristã,
como sendo incontestável, pois norteava os princípios da Justiça Divina, que sempre dá oportunidade ao homem
para rever seus erros e recomeçar o trabalho de sua regeneração, em nova
existência.
(Acaso tenho eu prazer na morte do perverso? diz o Senhor Deus.
Não, desejo eu antes que ele se converta do seu caminho e viva. (Ezequiel, cap,
XVIII, vs. 1 a 23.)
11) Tão certo como eu vivo,
diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso
se converta do seu caminho e viva. (Ezequiel, cap. XXXIII, v. 11)
Um fato marcou o Concílio de Constantinopla, atual Istambul, na Turquia,
em decisão política, para atender exigências do Império Bizantino, resolveu
abolir tal convicção, cientificamente justificada, substituindo-a pela
ressurreição, que contraria todos os princípios da ciência, pois admite a volta
do ser, por ocasião de um suposto juízo final, no mesmo corpo já desintegrado
em todos os seus elementos constitutivos.
O motivo foi de Teodora, esposa do famoso Imperador Justiniano,
escravocrata desumana e muito preconceituosa, temia retornar ao mundo, na pele
de uma escrava negra e, por isso, desencadeou uma forte pressão sobre o papa da
época, Virgílio, que subira ao poder através da criminosa intervenção do
general Belisário, para quem os desejos de Teodora eram lei.
Desta forma, o Concílio realizado em Constantinopla, no ano de 553 D.C,
resolveu eliminar, rejeitar, abolir todo o pensamento de Orígenes de
Alexandria, um dos maiores Teólogos que a Humanidade tem conhecimento. Com as
decisões do Concílio condenaram, inclusive, a reencarnação admitida, afirmada,
comprovada pelo próprio Cristo, em várias passagens do Evangelho, particularmente,
identificando em João Batista o Espírito do profeta Elias, morto séculos antes,
e que deveria voltar como precursor do Messias (Mateus 11:14 e Malaquias 4:5).
Nenhum comentário:
Postar um comentário