
A confiança é o alicerce de qualquer relacionamento interpessoal e o confiar plenamente ou não, vai depender da historia de vida de cada pessoa, dos valores éticos e morais, da conduta aceitável e inaceitável.
... Reconcilia-te com o teu adversário – advertiu Cristo – enquanto estás a caminho com ele.
E não é
precisamente no círculo aconchegante da família que estamos a caminho com
aquele que a nossa insensatez converteu em adversário?
O espiritismo coloca, pois, sob perspectiva inteiramente renovada e até inesperada, além de criativa e realista, a difícil e até agora inexplicável problemática do inter-relacionamento familial.
Se um
membro de nossa família tem dificuldades em nos aceitar, em nos entender, em
nos amar, podemos estar certos de que tais dificuldades foram criadas por nós mesmos
num relacionamento anterior em que as nossas paixões ignoraram o bom senso.
- E a
repulsão instintiva que se experimenta por algumas pessoas, donde se origina?
Perguntou Kardec aos seus instrutores (LIVRO DOS ESPÍRITOS, Pergunta 389).
- São espíritos antipáticos que se adivinham e reconhecem, sem se falarem.
O ponto de encontro de muitas dessas antipatias, que necessitam do toque mágico do amor e do entendimento, é a família consanguíneo, célula de um organismo mais amplo que é a família espiritual, que por sua vez, é a célula da instituição infinitamente mais vastas que são a família mundial e, finalmente, a universal.
A Doutrina considera a instituição do casamento como instrumento do “progresso na marcha da humanidade” e, reversamente, a abolição do casamento como “uma regressão à vida dos animais”. (Questões 695 e 696, de O LIVRO DOS ESPÍRITOS). Como vimos há pouco, é também essa a opinião dos cientistas especializados responsáveis.
Ao comentar as questões indicadas, Kardec acrescentou que – “O estado de natureza é o da união livre e fortuita dos sexos. O casamento constitui um dos primeiros atos de progresso nas sociedades humanas, porque estabelece a solidariedade fraterna e se observa entre todos os povos, se bem que em condições diversas”.
No que, mais uma vez, estão de acordo estudiosos do problema do ponto de vista científico e formuladores e divulgadores da Doutrina Espírita.
Isto nos
leva à delicada questão do divórcio, reconhecido como uma das principais causas
desagregadoras do casamento e, por extensão, da família.
O
problema da indissolubilidade do casamento foi abordado pelos Espíritos, de
maneira bastante sumária, na Questão nº. 697. Perguntados sobre se “Está na lei
da Natureza, ou somente na lei humana a indissolubilidade absoluta do
casamento”, responderam na seguinte forma:
- É uma
lei muito contrária à da Natureza. Mas os homens podem modificar suas leis; só
as da Natureza são imutáveis.
O que,
exatamente, quer dizer isso?

Realmente,
a lei natural ou divina não impõe inapelavelmente um tipo rígido de união,
mesmo porque o livre arbítrio é princípio fundamental, direito inalienável do
ser humano. “Sem o livre arbítrio – consta enfaticamente da Questão nº. 843 de
O LIVRO DOS ESPÍRITOS – o homem seria máquina”.
A lei
natural, por conseguinte, não iria traçar limites arbitrários às opções humanas,
encadeando homens e mulheres a um severo regime de escravidão, que poderá
conduzir a situações calamitosas em termos evolutivos, resultando em
agravamento dos conflitos, em lugar de os resolver, ou pelo menos atenuá-los.
Ademais,
como vimos lembrando repetidamente, o Espiritismo não se propõe a ditar regras
de procedimento específico para cada situação da vida. O que oferece são
princípios gerais, é uma estrutura básica, montada sobre a permanência e
estabilidade de verdades testadas e aprovadas pela experiência de muitos
milênios.
Que
dentro desse espaço se movimente a criatura humana no exercício pleno de seu
livre arbítrio e decida o que melhor lhe convém, ante o conjunto de
circunstâncias em que se encontra.
O
casamento é compromisso espiritual previamente negociado e acertado, ainda que
nem sempre aceito de bom grado pelas partes envolvidas. São muitos, senão
maioria, os que se unem na expectativa de muitos anos de turbulência e
mal-entendidos porque estão em débito com o parceiro que acolhem, precisamente
para que se conciliem se ajustem se pacifiquem e se amem ou, pelo menos, se
respeitem e estimem.
Mergulhados,
porém, na carne, os bons propósitos do devedor, que programou para si mesmo um
regime de tolerância e autocontrole, podem falhar.
Como
também pode exorbitar da sua desejável moderação o parceiro que vem para
receber a reparação, e em lugar de recolher com serenidade o que lhe é devido
(e outrora lhe foi negado) em atenção, apoio, segurança e afeto, assume a
atitude do tirano arbitrário que, além de exigir com intransigência o devido,
humilha, oprime e odeia o parceiro que, afinal de contas, está fazendo o
possível, dentro das suas limitações, para cumprir seu compromisso.
Nesses
casos, o processo de ajuste – que será sempre algo difícil mas poderá
desenrolar-se em clima de mútua compreensão – converte-se em vingança
irracional.
Numa
situação dessas, mais frequentes do que poderíamos supor, a indissolubilidade
absoluta a que se refere a Codificação seria, de fato, uma lei antinatural. Se
um dos parceiros da união, programada com o objetivo de promover uma
retificação de comportamento, utilizou-se insensatamente da sua faculdade de
livre escolha, optando pelo ódio e a vingança, quando poderia simplesmente
recolher o que lhe é devido por um devedor disposto a pagar, seria injusto que
a lei recusasse a este o direito de recuar do compromisso assumido, modificar
seus termos, ou adiar a execução, assumindo, é claro, todas as
responsabilidades decorrentes de seus atos, como sempre, aliás.
A lei
divina não coonesta a violência que um parceiro se disponha a praticar sobre o
outro.
Além do mais, a dívida não é tanto com o
indivíduo prejudicado quanto com a própria lei divina desrespeitada.
No
momento em que arruinamos ou assassinamos alguém, cometemos, claro, um delito
pessoal de maior gravidade.
É preciso
lembrar, contudo, que a vítima também se encontra envolvida com a lei, que,
paradoxalmente, irá exibir a reparação da falta cometida, não para vingá-la,
mas para desestimular o faltoso, mostrando-lhe que cada gesto negativo cria a
sua matriz de reparação.
O Cristo
foi enfático e preciso ao ligar sempre o erro à dor do resgate. “Vai e não
peques mais, para que não te aconteça coisa pior”, disse ele.

Se, em
lugar de reconciliar-se, ela se vingar, estará reabrindo sua conta como novo
débito em vez de saldá-la.
A lei
natural, portanto, não prescreve a indissolubilidade mandatária e absoluta do
casamento, como a caracterizou Kardec na sua pergunta. Consequentemente, a lei
humana não deve ser mais realista do que a outra que lhe é superior; deve ser
flexível, abrindo espaço para as opções individuais do livre arbítrio.
Isso,
contudo, está longe de significar uma atitude de complacência ou de estímulo à
separação dos casais em dificuldades.
O
divórcio é admissível, em situações de grave conflito, nas quais a separação
legal assume a condição de mal menor, em confronto com opções potencialmente
mais graves que projetam ameaçadoras tragédias e aflições imprevisíveis:
suicídios, assassinatos, e conflitos outros que destroem famílias e acarretam
novos e pesados compromissos, em vez de resolver os que já vieram do passado
por auto-herança.
Convém,
portanto, atentar para todos os aspectos da questão e não ceder
precipitadamente ao primeiro impulso passional ou solicitação do comodismo ou
do egoísmo.
Dificuldades
de relacionamento são mesmo de esperar-se na grande maioria das uniões que se
processam em nosso mundo ainda imperfeito. Não deve ser desprezado o importante
aspecto de que o casamento foi combinado e aceito com a necessária antecipação,
precisamente para neutralizar diferenças e dificuldades que persistem entre
dois ou mais Espíritos.
O que a
lei divina prescreve para o casamento é o amor, na sua mais ampla e abrangente
conotação, no qual o sexo é apenas a expressão física de uma profunda e serena
sintonia espiritual.
Estas
uniões, contudo, são ainda a exceção e não a norma. Ocorre entre aqueles que,
na expressão de Jesus, Deus juntou, na imutável perfeição de suas leis.
Que ninguém
os separe, mesmo porque, atingida essa fase de sabedoria, entendimento e
serenidade, os Espíritos pouco se importam de que os vínculos matrimoniais
sejam indissolúveis ou não em termos humanos, dado que, para eles vige a lei
divina que já os uniu pelo vínculo supremo do amor.
Em suma, recuar ante uma situação de desarmonia no casamento, de um cônjuge difícil ou de problemas aparentemente insolúveis é gesto e fraqueza e covardia de graves implicações.
Somos
colocados em situações dessas precisamente para resolver conflitos emocionais
que nos barram os passos no caminho evolutivo. Estaremos recusando exatamente o
remédio prescrito para curar mazelas persistente que se arrastam, às vezes, por
séculos ou milênios aderidas à nossa estrutura espiritual.
A separação e o divórcio constituem, assim, atitudes que não devem ser assumidas antes de profunda análise e demorada meditação que nos levem à plena consciência das responsabilidades envolvidas.
Como
escreveu Paulo com admirável lucidez e poder de síntese.
_ “Tudo
me é lícito, mas nem tudo me convém”.

É no
contexto da família que vem desaguar um volume incalculável de consequências
mais ou menos penosas resultantes de desacertos anteriores, de decisões tomadas
ao arrepio das leis flexíveis e, ao mesmo tempo, severas, que regulam o
universo ético em que nos movimentamos.
Para que
um dia possamos desfrutar o privilégio de viver em comunidades felizes e
harmoniosas, aqui ou no mundo póstumo, temos de aceitar, ainda que
relutantemente, as regras do jogo da vida. O trabalho da reconciliação com
espíritos que prejudicamos com o descontrole de nossas paixões, nunca é fácil
e, por isso, o comodismo nos empurra para o adiantamento das lutas e renúncias
por onde passa o caminho da vitória.
Como foro
natural de complexos problemas humanos e núcleo inevitável das experiências
retificadoras que nos incumbe levar a bom termo, a família é instrumento da
redenção individual e, por extensão, do equilíbrio social.
Não precisaria de nenhuma outra razão para ser estudada com seriedade e preservada com firmeza nas suas estruturas e nos seus propósitos educativos.
Fonte: A Família como Instrumento de Redenção Espiritual
Autor: Deolindo Amorim e Hermínio C. Miranda.
outras fontes de pesquisas:
http://www.psicologiaemanalise.com.br/2010/04/confianca.html