A
dissertação a seguir, dada espontaneamente por um Espírito superior, que se
revelou mediante comunicações de ordem elevadíssima, resume, de modo claro e
completo, a questão do papel do médium:
"Qualquer que seja a natureza dos
médiuns escreventes, quer mecânicos ou semimecânicos, quer simplesmente
intuitivos, não variam essencialmente os nossos processos de comunicação com
eles. De fato, nós nos comunicamos com
os Espíritos encarnados dos médiuns, da mesma forma que com os Espíritos
propriamente ditos, tão só pela
irradiação do nosso pensamento."
"Os nossos pensamentos não
precisam da vestidura da palavra, para serem compreendidos pelos Espíritos e
todos os Espíritos percebem os pensamentos que lhes desejamos transmitir, sendo
suficiente que lhes dirijamos esses pensamentos e isto em razão de suas
faculdades intelectuais.
Quer dizer que tal pensamento tais ou quais Espíritos o podem compreender, em
virtude do adiantamento deles, ao passo que, para tais outros, por não
despertarem nenhuma lembrança, nenhum conhecimento que lhes dormitem no fundo
do coração, ou do cérebro, esses mesmos pensamentos não lhes são perceptíveis.
Neste caso, o Espírito encarnado, que nos serve de médium, é mais apto a
exprimir o nosso pensamento a outros encarnados, se bem não o compreenda, do
que um Espírito desencarnado, mas pouco adiantado, se fôssemos forçado a
servir-nos dele, porquanto o ser terreno põe seu corpo, como instrumento, à
nossa disposição, o que o Espírito errante não pode fazer."
"Assim, quando encontramos em um
médium o cérebro povoado de conhecimentos adquiridos na sua vida atual e o seu
Espírito rico de conhecimentos latentes, obtidos em vidas anteriores, de
natureza a nos facilitarem as comunicações, dele de preferência nos servimos,
porque com ele o fenômeno da comunicação se nos toma muito mais fácil do que
com um médium de inteligência limitada e de escassos conhecimentos
anteriormente adquiridos. Vamos fazer-nos compreensíveis por meio de algumas
explicações claras e precisas."
"Com um médium, cuja inteligência
atual, ou anterior, se ache desenvolvida, o nosso pensamento se comunica
instantaneamente de Espírito a Espírito, por uma faculdade peculiar à essência
mesma do Espírito. Nesse caso, encontramos no cérebro do médium os elementos
próprios a dar ao nosso pensamento a vestidura da palavra que lhe corresponda e
isto quer o médium seja intuitivo, quer semimecânico, ou inteiramente mecânico.
Essa a razão por que, seja qual for a diversidade dos Espíritos que se
comunicam com um médium, os ditados que este obtém, embora procedendo de
Espíritos diferentes, trazem, quanto à forma e ao colorido, o cunho que lhe é
pessoal. Com efeito, se bem o pensamento lhe seja de todo estranho, se bem o
assunto esteja fora do âmbito em que ele habitualmente se move, se bem o que
nós queremos dizer não provenha dele, nem por isso deixa o médium de exercer
influência, no tocante à forma, pelas qualidades e propriedades inerentes à sua
individualidade.
- é exatamente como quando observais panoramas diversos, com lentes matizadas, verdes, brancas, ou azuis; embora os panoramas, ou objetos observados, sejam inteiramente opostos e independentes, em absoluto, uns dos outros, não deixam por isso de afetar uma tonalidade que provém das cores das lentes.
- Ou, melhor: comparemos os médiuns a esses bocais cheios de líquidos coloridos e transparentes, que se vêem nos mostruários dos laboratórios farmacêuticos. Pois bem, nós somos como luzes que clareiam certos panoramas morais, filosóficos e internos, através dos médiuns, azuis, verdes, ou vermelhos, de tal sorte que os nossos raios luminosos, obrigados a passar através de vidros mais ou menos bem facetados, mais ou menos transparentes, isto é, de médiuns mais ou menos inteligentes, só chegam aos objetos que desejamos iluminar, tomando a coloração, ou, melhor, a forma de dizer própria e particular desses médiuns.
- Enfim, para terminar com uma última comparação: nós os Espíritos somos quais compositores de música, que hão composto, ou querem improvisar uma ária e que só têm à mão ou um piano, um violino, uma flauta, um fagote ou uma gaita de dez centavos. É incontestável que, com o piano, o violino, ou a flauta, executaremos a nossa composição de modo muito compreensível para os ouvintes. Se bem sejam muito diferentes uns dos outros os sons produzidos pelo piano, pelo fagote ou pela clarineta, nem por isso ela deixará de ser idêntica em qualquer desses instrumentos, abstração feita dos matizes do som. Mas, se só tivermos à nossa disposição uma gaita de dez centavos, ai está para nós a dificuldade."
"Efetivamente, quando somos
obrigados a servir-nos de médiuns pouco adiantados, muito mais longo e penoso
se torna o nosso trabalho, porque nos vemos forçados a lançar mão de formas
incompletas, o que é para nós uma complicação, pois somos constrangidos a
decompor os nossos pensamentos e a ditar palavra por palavra, letra por letra,
constituindo isso uma fadiga e um aborrecimento, assim como um entrave real à presteza
e ao desenvolvimento das nossas manifestações."
"Por isso é que gostamos de achar
médiuns bem adestrados, bem aparelhados, munidos de materiais prontos a serem
utilizados, numa palavra: bons instrumentos, porque então o nosso perispírito,
atuando sobre o daquele a quem mediunizamos, nada mais tem que fazer senão
impulsionar a mão que nos serve de lapiseira, ou caneta, enquanto que, com os
médiuns insuficientes, somos obrigados a um trabalho análogo ao que temos,
quando nos comunicamos mediante pancadas, isto é, formando, letra por letra,
palavra por palavra, cada uma das frases que traduzem os pensamentos que vos
queiramos transmitir."
"É por estas razões que de
preferência nos dirigimos, para a divulgação do Espiritismo e para o desenvolvimento
das faculdades mediúnicas escreventes, às classes cultas e instruídas, embora
seja nessas classes que se encontram os indivíduos mais incrédulos, mais
rebeldes e mais imorais. E que, assim como deixamos hoje, aos Espíritos
galhofeiros e pouco adiantados, o exercício das comunicações tangíveis, de
pancadas e transportes, assim também os homens pouco sérios preferem o
espetáculo dos fenômenos que lhes afetam os olhos ou os ouvidos, aos fenômenos
puramente espirituais, puramente psicológicos."
"Quando queremos transmitir ditados
espontâneos, atuamos sobre o cérebro, sobre os arquivos do médium e preparamos
os nossos materiais com os elementos que ele nos fornece e isto à sua revelia.
E como se lhe tomássemos à bolsa as somas que ele aí possa ter e puséssemos as
moedas que as formam na ordem que mais conveniente nos parecesse."
"Mas, quando o próprio médium é
quem nos quer interrogar, bom é reflita nisso seriamente, a fim de nos fazer
com método as suas perguntas, facilitando-nos assim o trabalho de responder a
elas. Porque, como já te dissemos em instrução anterior, o vosso cérebro está
frequentemente em inextricável desordem e, não só difícil, como também penoso
se nos torna mover-nos no dédalo dos vossos pensamentos. Quando seja um terceiro
quem nos haja de interrogar, é bom e conveniente que a série de perguntas seja
comunicada de antemão ao médium, para que este se identifique com o Espírito do
evocador e dele, por assim dizer, se impregne, porque, então, nós outros
teremos mais facilidade para responder, por efeito da afinidade existente entre
o nosso perispírito e o do médium que nos serve de intérprete."
"Sem duvida, podemos falar de
matemáticas, servindo-nos de um médium a quem estas sejam absolutamente
estranhas; porém, quase sempre, o Espírito desse médium possui, em estado latente,
conhecimento do assunto, isto é, conhecimento peculiar ao ser fluídico e não ao
ser encarnado, por ser o seu corpo atual um instrumento rebelde, ou contrário,
a esse conhecimento. O mesmo se dá com a astronomia, com a poesia, com a
medicina, com as diversas línguas, assim como com todos os outros conhecimentos
peculiares à espécie humana."
"Finalmente, ainda temos como meio
penoso de elaboração, para ser usado com médiuns completamente estranhos ao
assunto de que se trate, o da reunião das letras e das palavras, uma a uma,
como em tipografia."
"Conforme acima dissemos, os
Espíritos não precisam vestir seus pensamentos; eles os percebem e transmitem,
reciprocamente, pelo só fato de os pensamentos existirem neles. Os seres
corpóreos, ao contrário, só podem perceber os pensamentos, quando revestidos.
Enquanto que a letra, a palavra, o substantivo, o verbo, a frase, em suma, vos
são necessários para perceberdes, mesmo mentalmente, as ideias, nenhuma forma
visível ou tangível nos é necessária a nós."
ERASTO e TIMÓTEO
Fonte: O Livro dos Médiuns – item
225 e Revista Espírita – junho 1861
NOTA. Esta análise do papel dos médiuns e dos processos pelos
quais os Espíritos se comunicam é tão clara quanto lógica. Dela decorre, como
princípio, que o Espírito haure, não as suas ideias, porém, os materiais de que
necessita para exprimi-las, no cérebro do médium e que, quanto mais rico em
materiais for esse cérebro, tanto mais fácil será a comunicação. Quando o Espírito se exprime num idioma
familiar ao médium, encontra neste, inteiramente formadas, as palavras
necessárias ao revestimento da ideia; se o faz numa língua estranha ao médium,
não encontra neste as palavras, mas apenas as letras. Por isso é que o Espírito
se vê obrigado a ditar, por assim dizer, letra a letra, tal qual como quem
quisesse fazer que escrevesse alemão uma pessoa que desse idioma não conhecesse
uma só palavra. Se o médium é
analfabeto, nem mesmo as letras fornece ao Espírito. Preciso se torna a este
conduzir-lhe a mão, como se faz a uma criança que começa a aprender. Ainda
maior dificuldade a vencer encontra aí, o Espírito.
Estes
fenômenos, pois, são possíveis e há
deles numerosos exemplos; compreende-se, no entanto, que semelhante maneira de
proceder pouco apropriada se mostra para comunicações extensas e rápidas e que
os Espíritos hão de preferir os instrumentos de manejo mais fácil, ou, como
eles dizem, os médiuns bem aparelhados do ponto de vista deles.
Se os que
reclamam esses fenômenos, como meio de se convencerem, estudassem previamente a
teoria, haviam de saber em que condições excepcionais eles se produzem.
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