O pensamento, dizíamos, é criador.
Não atua somente em roda de nós, influenciando nossos semelhantes para o bem ou
para o mal; atua principalmente em nós; gera nossas palavras, nossas ações e,
com ele, construímos, dia a dia, o edifício grandioso ou miserável de nossa
vida presente e futura.
Modelamos nossa alma e seu invólucro com os
nossos pensamentos; estes produzem formas, imagens que se imprimem na matéria
sutil, de que o corpo fluídico é composto.
Assim, pouco a pouco, nosso
ser povoa-se de formas frívolas ou austeras, graciosas ou terríveis, grosseiras
ou sublimes; a alma se enobrece, embeleza ou cria uma atmosfera de fealdade.
Segundo ideal a que visa, a chama interior aviva-se ou obscurece-se.
Não há assunto mais importante
que o estudo do pensamento, seus poderes e ação. É a causa inicial de nossa
elevação ou de nosso rebaixamento; prepara todas as descobertas da Ciência,
todas as maravilhas da Arte, mas também todas as misérias e todas as vergonhas
da Humanidade. Segundo o impulso dado, funda ou destrói as instituições como os
impérios, os caracteres como as consciências.
O homem só é grande, só tem
valor pelo seu pensamento; por ele suas obras irradiam e se perpetuam através
dos séculos. O Espiritualismo experimental, muito melhor
que as doutrinas anteriores, permite-nos perceber, compreender toda a força de
projeção do pensamento, que é o princípio da comunhão universal. Vemo-lo agir
no fenômeno espírita, que facilita ou dificulta; seu papel nas sessões de
experimentação é sempre considerável.
A Telepatia demonstrou-nos que
as almas podem impressionar-se, influenciar-se a todas as distâncias; é o meio
de que se servem as humanidades do Espaço para comunicarem entre si através das
imensidades siderais. Em qualquer campo das atividades sociais, em todos os
domínios do mundo visível ou invisível, a ação do pensamento é soberana; não é
menor sua ação, repetimos, em nós mesmos, modificando constantemente nossa
natureza íntima.
As vibrações de nossos
pensamentos, de nossas palavras, renovando-se em sentido uniforme, expulsam de
nosso invólucro os elementos que não podem vibrar em harmonia com elas; atraem
elementos similares que acentua as tendências do ser.
Uma obra, muitas vezes
inconsciente, elabora-se; mil obreiros misteriosos trabalham na sombra; nas
profundezas da alma esboça-se um destino inteiro; em sua ganga o diamante
purifica-se ou perde o brilho. Se meditarmos em assuntos elevados, na
sabedoria, no dever, no sacrifício, nosso ser impregna-se, pouco a pouco, das
qualidades de nosso pensamento. É por isso que a prece improvisada, ardente, o
impulso da alma para as potências infinitas, tem tanta virtude. Nesse diálogo
solene do ser com sua causa, o influxo do Alto invade-nos e desperta sentidos
novos.
A compreensão, a consciência
da vida aumenta e sentimos, melhor do que se pode exprimir, a gravidade e a
grandeza da mais humilde das existências. A oração, a comunhão pelo pensamento
com o universo espiritual e divino é o esforço da alma para a Beleza e para a
Verdade eternas; é a entrada, por um instante, nas esferas da vida real e
superior, aquela que não tem termo.
Se, ao contrário, nosso
pensamento é inspirado por maus desejos, pela paixão, pelo ciúme, pelo ódio, as
imagens que cria sucedem-se, acumulam-se em nosso corpo fluídico e o
entenebrecem.
Assim, podemos à vontade fazer
em nós a luz ou a sombra. o que afirmam tantas comunicações de além-túmulo.
Somos o que pensamos, com a condição de pensarmos com força, vontade e
persistência. Mas, quase sempre, nossos pensamentos passam constantemente de um
a outro assunto. Pensamos raras vezes por nós mesmos, refletimos os mil
pensamentos incoerentes do meio em que vivemos.
Poucos homens sabem viver do
próprio pensamento, beber nas fontes profundas, nesse grande reservatório de
inspiração que cada um traz consigo, mas que a maior parte ignora. Por isso
criam um invólucro povoado das mais disparatadas formas. Seu Espírito é como
uma habitação franca a todos os que passam. Os raios do bem e as sombras do mal
lá se confundem, num caos perpétuo. O combate incessante da paixão e do dever
em que, quase sempre, a paixão sai vitoriosa. Primeiro que tudo, é preciso
aprender a fiscalizar os pensamentos, a discipliná-los, a imprimir-lhes uma
direção determinada, um fim nobre e digno.
A fiscalização dos pensamentos
implica a fiscalização dos atos, porque, se uns são bons, os outros sê-lo-ão
igualmente, e todo o nosso procedimento achar-se-á regulado por uma
concatenação harmônica. Ao passo que, se nossos atos são bons e nossos
pensamentos maus, apenas haverá uma falsa aparência do bem e continuaremos a
trazer em nós um foco malfazejo, cujas influências, mais cedo ou mais tarde,
derramar-se-ão fatalmente sobre nossa vida.
Às vezes observamos uma
contradição surpreendente entre os pensamentos, os escritos e as ações de
certos homens, e somos levados, por esta mesma contradição, a duvidar de sua
boa-fé, de sua sinceridade.
Muitas vezes não há mais do
que uma interpretação errônea de nossa parte. Os atos desses homens resultam do
impulso surdo dos pensamentos e das forças que eles acumularam em si no
passado. Suas aspirações atuais, mais elevadas, seus pensamentos mais generosos
traduzir-se-ão em atos no futuro.
Assim, tudo se combina e
explica quando se consideram as coisas do largo ponto de vista da evolução; ao
passo que tudo fica obscuro, incompreensível, contraditório com a teoria de uma
vida única para cada um de nós. O contato pelo pensamento com os escritores de
gênio, com os autores verdadeiramente grandes de todos os tempos e países, lendo,
meditando suas obras, impregnando todo o nosso ser da substância de sua alma.
As radiações de seus pensamentos despertarão em nós efeitos semelhantes e
produzirão, com o tempo, modificações de nosso caráter pela própria natureza
das impressões sentidas.
É necessário escolhermos com
cuidado nossas leituras, depois amadurecê-las e assimilar-lhes a quintessência.
Em geral lê-se demais, lê-se depressa e não se medita. Seria preferível ler
menos e refletir mais no que meio seguro de fortalecer nossa inteligência, de
colher os frutos de sabedoria e beleza que podem conter nossas leituras. Nisso,
como em todas as coisas, o belo atrai e gera o belo, do mesmo modo que a
bondade atrai a felicidade, e o mal o sofrimento. O estudo silencioso e
recolhido é sempre fecundo para o desenvolvimento do pensamento.
É no silêncio que se elaboram
as obras fortes. A palavra é brilhante, mas degenera demasiadas vezes em
conversas estéreis, às vezes maléficas; com isso, o pensamento se enfraquece e
a alma esvazia-se. Ao passo que na meditação o Espírito se concentra, volta-se
para o lado grave e solene das coisas; a luz do mundo espiritual banha-o com
suas ondas.
Há em roda do pensador grandes
seres invisíveis que só querem inspirá-lo; é à meia luz das horas tranquilas ou
então à claridade discreta da lâmpada de trabalho que melhor podem entrar em
comunhão com ele. Em toda a parte, e sempre uma vida oculta mistura-se com a
nossa. Evitemos as discussões ruidosas, as palavras vãs, as leituras frívolas.
Sejamos sóbrios de jornais. A leitura dos jornais, fazendo-nos passar
continuamente de um assunto para outro, torna o Espírito ainda mais instável.
Vivemos
numa época de anemia intelectual, que é causada pela raridade dos estudos
sérios, pela procura abusiva da palavra pela palavra, da forma enfeitada e oca,
e, principalmente, pela insuficiência dos educadores da mocidade.
Apliquemo-nos a obras mais substanciais, a tudo o que pode esclarecer-nos a
respeito das leis profundas da vida e facilitar nossa evolução.
Pouco a pouco, ir-se-ão
edificado em nós uma inteligência e uma consciência mais fortes, e nosso corpo
fluídico iluminar-se-á com os reflexos de um pensamento elevado e puro.
Dissemos que a alma oculta
profundezas onde o pensamento raras vezes desce, porque mil objetos externos
ocupam-no incessantemente. Sua superfície, como a do mar, é muitas vezes
agitada; mas, por baixo, se estendem regiões inacessíveis às tempestades. Aí
dormem as potências ocultas, que esperam nosso chamamento para emergirem e
aparecerem. O chamamento raras vezes se faz ouvir e o homem agita-se em sua
indigência, ignorante dos tesouros inapreciáveis que nele repousam.
É necessário o choque das
provações, as horas tristes e desoladas para fazer-lhe compreender a
fragilidade das coisas externas e encaminhá-lo para o estudo de si mesmo, para
a descoberta de suas verdadeiras riquezas espirituais. É por isso que as
grandes almas se enobrecem e embelezam tanto mais quanto mais vivas são suas
dores.
A cada nova desgraça que as
fere têm a sensação de se haverem aproximado um pouco mais da verdade e da
perfeição e, a este pensamento, experimentam uma como volúpia amarga.
Levantou-se uma nova estrela no céu de seu destino, estrela cujos raios
trêmulos penetram no santuário de sua consciência e lhe iluminam os recônditos.
Nas inteligências de cultura elevada faz sementeira a desgraça: cada dor é um
sulco onde se levanta uma seara de virtude e beleza. Em certas horas de nossa
vida, quando nos morre nossa mãe, quando se desmorona uma esperança
ardentemente acariciada, quando se perde a mulher, o filho amado, de cada vez
que se despedaça um dos laços que nos ligavam a este mundo, uma voz misteriosa
eleva-se nas profundezas de nossa alma, voz solene que nos fala de mil leis
augustas, mais veneráveis que as da Terra e entreabre-se todo um mundo ideal.
Mas, os ruídos do exterior
abafam-na bem depressa e o ser humano recai quase sempre em suas dúvidas, em
suas hesitações, na rara vulgaridade de sua existência. * Não há progresso
possível sem observação atenta de nós mesmos. Necessário vigiar todos os nossos
atos impulsivos para chegarmos a saber em que sentido devemos dirigir nossos
esforços para nos aperfeiçoarmos. Primeiramente, regular a vida física, reduzir
as exigências materiais ao necessário, a fim de garantir a saúde do corpo,
instrumento indispensável para o desempenho de nosso papel terrestre.
Depois disciplinar as
impressões, as emoções, exercitando-nos em dominá-las, em utilizá-las como
agentes de nosso aperfeiçoamento moral; aprender principalmente a esquecer, a
fazer o sacrifício do eu, a desprender-nos de todo o sentimento de egoísmo. A
verdadeira felicidade neste mundo está na proporção do esquecimento próprio.
Não basta crer e saber, é necessário viver nossa crença, isto é, fazer penetrar
na prática diária da vida os princípios superiores que adotamos; é necessário
habituarmo-nos a comungar pelo pensamento e pelo coração com os Espíritos
eminentes que foram os reveladores, com todas as almas de escol que serviram de
guias à Humanidade, viver com eles numa intimidade cotidiana, inspirar-nos em
suas vistas e sentir sua influência pela percepção íntima que nossas relações
com o mundo invisível desenvolvem.
Entre estas grandes almas é
bom escolher uma como exemplo, a mais digna de nossa admiração e, em todas as
circunstâncias difíceis, em todos os casos em que nossa consciência oscila
entre dois partidos a tomar, inquirirmos o que ela teria resolvido e
procedermos no mesmo sentido. Assim, pouco a pouco, iremos construindo, de
acordo com esse modelo, um ideal moral que se refletirá em todos os nossos
atos. Todo homem, na humilde realidade de cada dia, pode ir modelando uma
consciência sublime.
A obra é vagarosa e difícil,
mas, por isso, são-nos dados os séculos. Concentremos, pois, muitas vezes,
nossos pensamentos, para dirigi-los, pela vontade, em direção ao ideal sonhado.
Meditemos nele todos os dias, à hora certa, de preferência pela manhã, quando
tudo está sossegado e repousa ainda em roda de nós, nesse momento a que o poeta
chama "a hora divina", quando a Natureza, fresca e descansada, acorda
para as claridades do dia.
Nas horas matinais, a alma,
pela oração e pela meditação, eleva-se com mais fácil impulso até às alturas
donde se vê e compreende que tudo — a vida, os atos, os pensamentos — está
ligado a alguma coisa grande e eterna e que habitamos um mundo em que potências
invisíveis vivem e trabalham conosco. Na vida mais simples, na tarefa mais
modesta, na existência mais apagada, mostram-se, então, faces profundas, uma
reserva de ideal, fontes possíveis de beleza.
Cada
alma pode criar com seus pensamentos uma atmosfera espiritual tão bela, tão
resplandecente, como nas paisagens mais encantadoras; e, na morada mais
mesquinha, no mais miserável tugúrio, há frestas para Deus e para o Infinito!
Extraído
do livro: O problema do Ser, do Destino e da Dor – item XXIV – Leon Denis
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