domingo, 19 de julho de 2015

Influência do Exercício da Mediunidade Sobre a Saúde, Sobre o Cérebro e Sobre as Crianças

por ALLAN KARDEC – tradução de José Herculano Pires


Cap. 18 – INCONVENIENTES E PERIGOS DA MEDIUNIDADE
Influência do Exercício da Mediunidade Sobre a Saúde, Sobre o Cérebro e Sobre as Crianças
            221. 1. A faculdade mediúnica é indício de algum estado patológico ou simplesmente anormal?

            — Às vezes anormal, mas não patológico. Há médiuns de saúde vigorosa. Os doentes o são por outros motivos.
            2. O exercício da faculdade mediúnica pode causar fadiga?

            — O exercício muito prolongado de qualquer faculdade produz fadiga. Com a mediunidade acontece o mesmo, principalmente com a de efeitos físicos. Esta ocasiona um dispêndio de fluidos que leva o médium à fadiga, mas que é reparado pelo repouso. (1)
        3. O exercício da mediunidade pode ter inconvenientes em si mesmo no tocante às condições de higidez, excluindo-se os casos de abuso?
            — Há casos em que é prudente e mesmo necessário abster-se ou pelo menos moderar o uso da mediunidade. Isso depende do estado físico e moral do médium, que geralmente o percebe. Quando ele começa a sentir-se fatigado, deve abster-se.

            4. Esse exercício teria mais inconvenientes para uma pessoa do que para outras?
            — Como já disse, isso depende do estado físico e moral do médium. Há pessoas que devem evitar qualquer causa de superexcitação, e a prática mediúnica seria uma delas. (Ver nºs 188 e 194).

            5. A mediunidade poderia produzir a loucura?
             — Não produziria mais do que qualquer outra coisa, quando a fraqueza do cérebro não oferecer predisposição para isso. A mediunidade não produzirá a loucura, se esta já não existir em germe. Mas se o seu princípio já existe, o que facilmente se conhece pelas condições psíquicas e mentais da pessoa, o bom senso nos diz que devemos ter todos os cuidados necessários, pois nesse caso qualquer abalo será prejudicial. (2)
         6. Será inconveniente desenvolver a mediunidade das crianças?
            — Certamente. E sustento que é muito perigoso. Porque esses organismos frágeis e delicados seriam muito abalados e sua imaginação infantil muito superexcitada. Assim, os pais prudentes as afastarão dessas ideias, ou pelo menos só lhes falarão a respeito no tocante às consequências morais. (3)

            7. Mas há crianças que são médiuns naturais, seja de efeitos físicos, de escrita ou de visões. Haveria nesses casos o mesmo inconveniente?
            — Não. Quando a faculdade se manifesta espontânea numa criança, é que pertence à sua própria natureza e que a sua constituição é adequada. Não se dá o mesmo quando a mediunidade é provocada e excitada. Observe-se que a criança que tem visões geralmente pouco se impressiona com isso. As visões lhe parecem muito naturais, de maneira que ela lhes dá pouca atenção e quase sempre as esquece. Mais tarde a lembrança lhe volta à memória e é facilmente explicada, se ela conhecer o Espiritismo.

            8. Qual a idade em que se pode, sem inconveniente, praticar a mediunidade?
            — Não há limite preciso na idade. Depende inteiramente do desenvolvimento físico e mais particularmente do desenvolvimento psíquico. (4)  Há crianças de doze anos que seriam menos impressionadas que algumas pessoas já formadas. Refiro-me à mediunidade em geral, pois a de efeitos físicos é mais fatigante para o corpo. Quanto à escrita há outro inconveniente, que é a falta de experiência da criança, no caso de querer praticá-la sozinha ou fazer dela um brinquedo.

            222. A prática do Espiritismo, como adiante veremos, requer muito tato para se desfazer o embuste dos Espíritos mistificadores. Se homens feitos são por eles enganados, a infância e a juventude estão ainda mais expostas a isso, por sua inexperiência. Sabe-se também que o recolhimento é condição essencial para se tratar com Espíritos sérios. As evocações feitas levianamente ou por divertimento constituem verdadeira profanação, que abre a porta aos Espíritos zombeteiros ou malfazejos. Como não se pode esperar de uma criança a gravidade necessária a um ato semelhante, seria de temer que, entregue a si mesma, ela o transformasse em brinquedo. Mesmo nas condições mais favoráveis, é de se desejar que uma criança dotada de mediunidade só a exerça sob a vigilância de pessoas experimentadas, que lhe ensinarão, por exemplo, o respeito devido às almas dos que se foram deste mundo.

            Vê-se, pois, que o problema da idade está subordinado tanto às condições do desenvolvimento físico, quanto às do caráter ou amadurecimento moral(5).Entretanto, o que ressalta claramente das respostas acima é que não se deve forçar o desenvolvimento da faculdade mediúnica nas crianças, quando ela não se desenvolver de maneira espontânea, e que em todos os casos é necessário empregá-la somente com grande circunspecção, não se devendo jamais provocá-la ou encorajar o seu exercício pelas pessoas  fracas.
            Deve-se afastar da prática mediúnica, por todos os meios possíveis, as que apresentem os menores sinais de excentricidade nas ideias ou de enfraquecimento das faculdades mentais, porque são evidentemente predispostas à loucura, que qualquer motivo de superexcitação pode desenvolver.
            As ideias espíritas não têm, a esse respeito, maior influência que as outras, mas se a loucura se declarar tomará o caráter de preocupações dominante, como tomaria o caráter religioso, se a pessoa se entregasse com excesso às práticas devocionais, e a responsabilidade seria atribuída ao Espiritismo. O que se pode fazer de melhor com qualquer pessoa que revele tendência à ideia é dirigir as suas preocupações em outra direção, a fim de proporcionar descanso aos órgãos enfraquecidos. (6) 
            Chamamos a atenção dos leitores, a esse respeito, para o parágrafo XII da introdução de O Livro dos Espíritos.


Comentários de Herculano Pires quando da tradução
(1)  Esses problemas, da natureza patológica da mediunidade e da fadiga no seu exercício, vêm sendo objeto de pesquisas e estudos na Parapsicologia. As conclusões atingidas até agora são inteiramente favoráveis à tese espírita. Robert Amadou, antiespírita, declara peremptoriamente. “Os fenômenos paranormais não são patológicos”. (La Prapsychologie, IV Parte, cap. IV, nº 5). Rhine faz a mesma afirmação. Considerados como o resultado de uma faculdade humana natural e comum, esses fenômenos não podem ser encarados como patológicos. Assim, a Parapsicologia resolveu cientificamente o problema criado pelos acusadores do Espiritismo. E reafirmou, afirmação espírita de que a Medicina precisa conhecer esses fenômenos. Quanto à fadiga, foi também constatado o seu efeito nas experimentações parapsicológicas. A fadiga se refere aos órgãos corporais do médium e não ao seu Espírito. (N. do T.)

(2) Os adversários se servem destes conselhos sensatos para combaterem a prática geral da mediunidade. Seria o mesmo que condenar a prática geral dos esportes pelo fato de os enfermos não poderem praticá-lo. (N. do T.)
(3)  Este é um problema de psicologia infantil, que serve para mais uma vez    comprovar a natureza e a atitude científicas do Espiritismo no trato dos problemas psíquicos. Há crianças que revelam precocemente suas faculdades mediúnicas, mas seria errôneo querer desenvolvê-las de maneira sistemática. O que se deve dar às crianças em geral é o ensino moral do Espiritismo, preparando-as para uma vida bem orientada pelo conhecimento doutrinário, sem qualquer excitação prematura das faculdades psíquicas, que se desenvolverão no tempo devido. Nos casos tratados no item 7 temos o desenvolvimento espontâneo, que é diferente. (N. do T.)
(4) As traduções em geral repetem a expressão francesa développement moral, mas a palavra moral não tem entre nós a mesma amplitude de sentido do francês. Não se trata de desenvolvimento moral, segundo geralmente entende a expressão, mas do desenvolvimento psíquico da criança, como o próprio texto o indica. (N. do T.) 
(5) O texto francês se refere a circonstances tant du temperament que de caractere, expressões que têm sido traduzidas literalmente, mas que não possuem em português o mesmo sentido. (N. do T.)

(6) Há livros inteiros, de médicos eminentes, atribuindo ao Espiritismo a causa da maioria dos casos de loucura. Kardec, entretanto, já havia advertido, desde a publicação de O Livro dos Espíritos, em 1857, que a causa real não está nas ideias ou nas crenças da pessoa, mas na sua condição mental ou cerebral. O seu conselho de precauções na prática da mediunidade serviu, embora a contra senso, para fundamentar as acusações contra o Espiritismo. Hoje, felizmente, nos meios científicos atualizados, chegou-se à compreensão da verdade ensinada por Kardec. As pesquisas parapsicológicas, por sua vez, vêm confirmando a tese Kardeciana. Só o fanatismo ou a ignorância podem justificar hoje a repetição dessas acusações absurdas. (N. do T.)

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